sexta-feira, 27 de novembro de 2009

A ala geriátrica da biblioteca do gajo

Já são 810 primaveras!

Hoje é feriado municipal aqui pela Guarda. Não houve tempo para ir à torre de menagem ver os recém-inaugurados melhoramentos. Os quais incluem a projecção do foral da cidade num dos pisos e um centro de interpretação. Já aqui tinha dado conta das obras de requalificação então anunciadas, sob o título "O Novo Belvedere". A visita fica então para amanhã. Por sua vez, daqui a duas horas, perspectiva-se mais um grande acontecimento musical. Trata-se do espectáculo "Mestres de Capela da Sé da Guarda" (séc. XVI-XIX), sob a direcção de João Pedro Delgado e Domenico Ricci, no TMG.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

A balança

Mário Machado e 7 elementos do seu gang foram hoje acusados de vários crimes de roubo e sequestro e de associação criminosa. Aquele já se encontrava em prisão preventiva desde o ano passado, medida aplicada no âmbito de outro procedimento criminal. Espera-se que o MP seja igualmente célere e expedito no caso "Face Oculta".

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Nem mais

terça-feira, 24 de novembro de 2009

123

O mobbing dos remediados - 3

Escrever um artigo, depois de algum labor investigador, deixando de lado as feromonas e insistindo num certo depuramento opinativo. Ter tudo pronto, corrigido e revisto. Porém, no último momento, carregar na tecla errada. E eis o desastre a acontecer, numa fracção de segundo. Ou seja, ocorreu o pior pesadelo, o écran branco, sem remissão. Aconteceu-me outro dia, após ter escrito uma crítica ao último documentário de Jorge Pelicano, "Pare, escute e olhe", sobre o qual tenho muitas reservas, para editar aqui no blogue. Um dia destes reconstituí-lo-ei, pois a memória não perdoa.
A propósito, recentemente escrevi um comentário noutro blogue, a propósito do mesmo filme, onde expus as minhas razões. Logo a seguir, veio o comentário de um anónimo, destes que pululam nas caixas de comentários como se chafurdassem no seu elemento natural, o curral. O patusco disse que eu era "fassista", saudoso de uma primavera que não percebi bem qual e imputando-me uma linhagem nobilitante que, para minha estupefacção, me foi até hoje sonegada. E que incluía Telles, com dois lês, entre outros. O desespero de não ter um único argumento, ou sequer uma ideia, foi assim compensado com a "valentia" de um ataque sem rosto. Quem o faz, sabe melhor do que ninguém porque se esconde. Nada de novo, é claro. Já disse aqui e aqui, o que penso sobre esta fauna suína das caixas de comentários. O que significa que não me vou sequer repetir. Mas neste caso quis ir mais longe. Analisei detalhadamente as características morfológicas e ortográficas da escrita, bem como os pontos de fervura mais recorrentes, os enlaces ideológicos, as idiossincrasias, os lapsos, de dois ou três comentadores habitués desse blogue. Sobraram dois. Um é um ilustre comediógrafo e cronista com ligações à Guarda, notabilizado pela irracionalidade e pelo ressentimento. A obesidade correspondente da eminência decerto esconde a dimensão liliputiana do seu talento, mais em baixo. Sobretudo do próprio. O outro é um obscuro ambientalista, de que me ocuparei noutro post, dedicado aos insectos voadores. Há ainda a forte possibilidade de o comentário resultar de um personagem multi identitário, um fenómeno conhecido da blogosfera. Seja como for, neste episódio os meus objectivos foram plenamente conseguidos. Ao torpedear o unanimismo e o pensamento único, realidades que imperam em certos meios, na Guarda e fora dela, veio imediatamente o troco. A virulência da reacção, só suplantada pela sua indigência, demonstrou que toquei na ferida.

Stalker

A idade dos porquês - 6

Porque é que, para além da complacência, a criação cultural tem outro inimigo de peso: o amiguismo? O amiguismo, em versão low tech, resume-se a uma troca acrítica de favores, cumplicidades, apreciações invariavelmente positivas, em circuito fechado, sem qualquer distanciamento, aos unanimismos paroquiais, às clássicas palamadinhas nas costas e que mais tarde são cobradas com juros... Eis o cardápio dos piores cancros da cultura e um alarmante sintoma de provincianismo...

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

A irmandade da sucata (2)

Sobre as conversas escutadas entre Sócrates e seu amigo Vara, ao que parece a propósito da compra fraudulenta da TVI pela PT, que o Presidente do STJ convenientemente mandou apagar, leia-se este texto lapidar no "Vivo e de Boa Saúde". Note-se que a celeridade da decisão permite imaginar o pior.

Frimário


(de 21 de Novembro a 20 de Dezembro)

A cáfila

Recebi um email que diz isto:

SILVA LOPES, com 77 (setenta e sete) anos de idade, acaba de ser nomeado administrador da "EDP Renováveis". Ex-Administrador do Montepio Geral, de onde saiu há pouco tempo com uma indemnização de mais de 400.000 euros, acrescidos de varias reformas que tem, uma das quais do Banco de Portugal como ex-governador, logo que saiu do Montepio foi nomeado Administrador da EDP RENOVAVEIS, empresa do Grupo EDP. Com mais este tacho dourado, lá vai sacar mais umas centenas de milhar de euros num emprego dado pela escumalha politica do governo, que continua a distribuir milhões pela cambada afecta aos partidos do centrão. Entretanto o Zé vai empobrecendo cada vez mais, num pais com 20% de pobres, onde o desemprego caminha para niveis assustadores, onde os salários da maioria dos portugueses estão cada vez mais ao nivel da subsistencia.
Silva Lopes foi o tal que afirmou ser necessário o congelamento de salários e o não aumento do salário mínimo nacional, por causa da competividade da economia portuguesa. Claro que para este senhor, o congelamento dos salários deve ser uma atitude a tomar, (desde que não congelem o dele, claro)!!!
Quanto a FERNANDO GOMES, mais um comissário político do PS, recebeu em 2008, como administrador da GALP, mais de 4 milhões de euros de remunerações. Acresce a isto um PPR de 90.000 euros anuais, para quando o " comissário PS " for para a reforma. Claro que isto não vai acontecer pois, tal como Silva Lopes, este senhor vai andar de tacho em tacho, tal como esta cambada de ex-politicos que perante a crise "assobia para o ar ", sempre com os bolsos cheios com os milhões de euros que vão recebendo anualmente.

Claro que as pessoas estão mais do que avisadas. A monstruosa promiscuidade entre os negócios e a política é o pão nosso de cada dia. Claro que os cidadãos sabem que esta deriva de sinecuras e transferências milionárias é uma doença crónica do Bloco Central. Mas onde o PS tem exagerado para lá do que é imaginável. Claro que estes filhos da puta só alteram os métodos depois de um abanão a sério. Muitos, como é o caso do esbriba, não se reconhecem nesta plutocracia monopartidária (às vezes bi), nesta baixíssima qualidade de um regime que alguns confundem com democracia. Periodicamente, convém exemplificar os motivos desta descrença. Como agora. Por uma questão profiláctica.

domingo, 22 de novembro de 2009

Névoa

pensar com delicadeza, imaginar com ferocidade...

Sintra: vendedor de bifanas em greve de fome há dez dias junto à câmara municipal
  1. encapsular paisagens para
  2. tentar perceber as pegadas do quotidiano
pensar com delicadeza, imaginar com ferocidade...
  • Ozono mata, confirma estudo
pensar com delicadeza, imaginar com ferocidade...
Frente Comum pondera manutenção de greve
Parlamento discute a 23 de Maio redução do IVA de 21 para 20 por cento
p e n s a r c o m d e l i c a d e z a, i m a g i n a r c o m f e r o cidade...

(colagem a partir de um verso de Herberto Helder)

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

A estreia é já amanhã, sábado!

(clicar para ampliar)

Ver aqui mais informação, a apresentação de A.R. e o meu comentário neste blogue.

Lux

Recomendo uma visita à "Rua dos Dias que Voam". Porquê? É que está lá "exposta" uma colecção de imagens com anúncios de estrelas de cinema, publicitando o sabonete Lux. Na mais antiga, seguramente dos anos 30, encontramos Mae West a falar com um cupido, não sem um afrodisíaco sabonete pelo meio. Vá, corram! Depois não digam que não avisei!

A agenda socrática

Um grande empresário português marca uma audiência com José Sócrates, na Residência Oficial do Primeiro-Ministro. Enquanto aguarda, encontra Armando Vara que o recebe com muitos abraços. Quando é recebido pelo Primeiro-Ministro, sente falta da carteira e resolve abordar o assunto com o PM:
- Não sei como lhe hei-de dizer, Senhor Primeiro-Ministro, mas a minha carteira acabou de desaparecer!
E continuou:
- Tenho a certeza de que estava com ela ao entrar na sala de espera. Tive o cuidado de a guardar bem, após apresentar o BI ao segurança. Não quero fazer nenhuma insinuação, mas a única pessoa com quem estive depois disso foi o Dr. Armando Vara, que está aqui na sala de espera ao lado.
O Primeiro-Ministro retira-se do gabinete. Pouco tempo depois, regressa com a carteira na mão.
Reconhecendo a sua carteira, o empresário comenta:
- Espero não ter causado nenhum embaraço pessoal entre o Senhor Primeiro-Ministro e o Dr. Armando Vara .
Ao que José Sócrates responde:
- Não se preocupe! Ele nem percebeu!...

A anedota é esta. Mas à semelhança dos autores romanos, que gostavam de acrescentar uma pormenor pícaro aos mitos gregos (veja-se como Plínio, o Velho, tratou o espectro de Narciso, o esbelto filho do deus-rio Cefiso e da ninfa Liríope, descrevendo-o a debruçar-se da barca, freneticamente, para se contemplar uma última vez nas águas do Rio Lethes, ao atravessá-lo), gostava também aqui de meter a colher. Então é assim: depois da reunião, Sócrates foi consultar o dicionário de sinónimos, com um compêndio de inglês técnico ao lado, afim de engendrar as invectivas com que iria brindar Pacheco Pereira no próximo debate parlamentar. Pois é. Depois dos sensacionais "você não passa de um revolucionário retardado" e "revolucionário uma vez, revolucionário toda a vida", aguardam-se as próximas manifestações de ressabiamento do licenciado Sócrates.

Os sapatos que o gajo levou à cinderela, armado em príncipe encantado

E depois do adeus

Maria do Carmo Borges anunciou que não continuará no cargo de governadora civil da Guarda. Irá assim permanecer em funções unicamente até ser nomeado novo titular. Esta sua decisão encerra um significado óbvio. O de que irá, muito provavalmente, abandonar a vida política activa. Muitas leituras e apreciações se têm feito acerca do seu desempenho público, sobretudo enquanto presidente da Câmara. Pessoalmente, só conheci de perto o seu último mandato, entre 2001 e 2005. Durante esse período, quer pelo que lia na imprensa, quer por algumas reuniões que mantive com a então presidente, quando dirigia o Aquilo Teatro, sempre tive uma boa impressão de MCB. Sobretudo pela forma directa e voluntariosa como abordava as questões discutidas. Significa isto que uma impressão pessoal favorável, de pendor subjectivo, pode ser transposta para uma apreciação de cariz político? Não necessariamente. Creio até que o seu consulado autárquico será lembrado como a máquina que prolongou a agonia terminal da época desastrosa de Abílio Curto. Não por acção, mas sobretudo por omissão. Não pela forma, mas pelo conteúdo. Não pelo dolo, mas pela negligência. Deixou que a inércia dos hábitos nocivos se sobrepusesse ao reformismo prudente, mas firme. MCB não desligou pois a máquina, numa altura em que a eutanásia política era a única solução para a Guarda. E teve tempo e legitimidade para o fazer. Os resultados viram-se: pré-falência técnica da Câmara, cedência aos pequenos poderes instalados na autarquia e adjacências, má gestão dos temas fortes da agenda política guardense (novo hospital, CTT, fecho da VICEG, só para dar alguns exemplos). Claro que nem tudo foi negativo. Bem pelo contrário. Do outro lado da balança, poderia colocar a construção de equipamentos públicos, como as piscinas, a remodelação do estádio e do parque municipais, a comparticipação na construção do Teatro Municipal, a criação da Culturguarda, entidade gestora dos equipamentos culturais do concelho, o apoio às entidades associativas, requalificação urbana em vários pontos da cidade, etc. É de realçar o facto de ter apoiado sem hesitações a actividade cultural, nas suas várias vertentes, ajudando a projectar a cidade nesse campo de forma ímpar. Claro que é defensável a opinião de que utilizou a cultura como bandeira de conveniência. Mas é caso para dizer que, neste caso, os fins justificam os meios. Só por isso, valerá a pena estar grato a MCB.
Como nota final, tudo indica que o senhor que se segue na cadeira de governador ainda é uma incógnita. No entanto, aceitam-se apostas múltiplas numa tripla...

PS (23h00): afinal, hoje mesmo foi divulgado o nome do novo Governador Civil. Trata-se de Santinho Pacheco, antigo presidente da Câmara de Gouveia.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Minimamente

foto de ensaio de Armando Neves/TMG

"Minimamente" tem estreia marcada no Pequeno Auditório do Teatro Municipal da Guarda. Será neste sábado, pelas 21h30. A interpretação estará a cargo de Agostinho da Silva, Albino Bárbara, Carlos Lopes, Cristina Fernandes, Filipa Teixeira, Daniel Rocha e deste vosso criado. O apoio à encenação é de Américo Rodrigues e a sonoplastia é de Victor Afonso.
1. O espectáculo. "Minimamente" foi construído a partir de "Histórias Mínimas", do dramaturgo catalão Javier Tomeo. Trata-se de um conjunto de 44 micro histórias desconcertantes, cuja primeira edição é de 1988. São crianças que partem a lua à pedrada, barbeiros que degolam os seus clientes, leões com dentadura postiça, oceanos que cabem numa garrafa, esqueletos que conversam no cemitério, estrelas que se apagam com um sopro. Ou seja, brevíssimas pinceladas escritas com um humor transbordante, com finura, onde o quotidiano se torna uma amostra do absurdo e vice versa. A peça pretende reproduzir este clima, onde as convenções da própria ficção não resistem à derisão de um humor cáustico e arguto. A encenação é atípica, ou seja, sendo colectiva é orientada por Américo Rodrigues. Como curiosidade, esta foi também a peça escolhida para a estreia do grupo "“As boas raparigas vão para o céu, as más a todo o lado”, no início dos anos 90.
2. O grupo. Tintinolho é um cume sobranceiro ao vale do Mondego, a 4 Km da Guarda. Onde existiu um importante castro, ocupado desde a Idade do ferro até à Alta Idade Média e cujos vestígios do imponente recinto muralhado ainda hoje são visíveis à distância. "Tintinolho" foi a designação escolhida para um projecto que reúne um conjunto de amantes do teatro, cujo primeiro objectivo foi levar à cena esta produção colectiva. A experiência teatral dos participantes é a mais diversa. O que não impediu, bem pelo contrário, que esta aventura fosse levada a bom termo. Para já, assenta-lhe bem a designação "grupo informal", ou "projecto". "Companhia" logo se verá...
3. Finale andante. O que posso dizer da minha experiência nesta aventura artística? Em certos momentos, encontrei os meus personagens pelo rasto que deixavam numa paisagem deserta. Era um olfacto canino que os reconstituía e uma memória audaciosa que os colocava no seu lugar provisório. Numa das suas faces, o teatro parte desta brancura imaculada do momento zero, do instante fundador. Uma economia profundamente humana, onde perscruto os meus personagens. Suspensos. Hesitantes. Amantes da música. Prisioneiros da cor do pormenor. Da vida derramada como aguarela num descampado. Onde os faço banhar numa bruma verbal delicadamente irisada. Seres encantadores e ineficazes. Criaturas bizantinas e patéticas. Idealistas inúteis. Sedutores por tédio. Heróis detentores de uma bela verdade humana. Fardo esse que não podem carregar nem evitar carregar. São personagens que tropeçam. Que tropeçam porque olham para as estrelas. Enquanto caminham. Que podiam sonhar, mas não governar.

Stalker



Sopa da pedra

Sou espectador assíduo do programa Ponto/Contraponto, na SIC Notícias. Um emissão onde Pacheco Pereira tem oportunidade de se debruçar em pormenor sobre vários exemplos de mau jornalismo. E de como isso ilustra a falta de pluralidade e de isenção na informação. JPP é aqui, com toda a propriedade, uma espécie de provedor do cidadão, no que aos media diz respeito. E o programa é claramente um exemplo de serviço público. Ora, os baixos níveis de qualidade da maioria do jornalismo que se pratica no nosso país aferem-se, sobretudo, no tipo de tratamento dado aos temas de 1ª página. Mas nem por isso o tipo de apresentação das notícias "menores" deixará de definir também um quadro clínico de negligência e falta de rigor. Muitas vezes, é mesmo através do pormenor que se detectam os principais sintomas.
E é precisamente de um exemplo desses que hoje irei falar. Recentemente, no "Portugal em Directo" emitido pela RDP Centro, a seguir ao noticiário das 13h00, um jornalista dessa estação apresentava o "X Festival de Sopas da Serra da Estrela", em S. Paio, Gouveia. Claro que se não andasse com uma dieta semi-rigorosa às costas, tinha lá dado um pulo, mas a questão não é essa. Em termos globais, se abstrairmos do indiscutível mérito da ideia e da qualidade evidenciada, o facto em si não passa de mais uma iniciativa de promoção local. Todavia, o tratamento dado por esse jornalista foi desastroso. Após a descrição inicial, com aquele à vontade de quem associa uma mostra gastronómica a uma quermesse de feira, informou o auditório indígena que os que ali acorriam estavam (sic) "sequiosos de comer"!!! Sequiosos? Mas de comer o quê? As sopas, presumo! Confesso que, em termos semânticos, é complicado definir a apetência segregada no hipotálamo por uma sopa. Será sede? Será fome? Será uma sede que não chega a ser fome? Será uma fome envergonhada, mascarada de sede? Ou antes uma irreprimível necessidade de um aconchego da alma, por via do estômago, sem demasiado comprometimento? É de supôr que todas estas visões contraditórias passaram pela cabeça do jornalista. Se tal ocorreu depois de uma prova das sopas, é de supôr igualmente que o paradoxo se transmutou, adquirindo as propriedades do puro disparate. Se foi antes, é de acatar a hipótese de o jornalista pré-comensal ter ficado à mercê do trocadilho semântico de ocasião. Ou seja, o pau para toda a colher dos preguiçosos. E a ocasião produziu um magnífico oxímoro (figura de estilo que consiste numa contradição muito intensa e cujo significado é aparentemente absurdo). Vejamos então a definição para "sequioso" no Dicionário Priberam de Língua Portuguesa: 1. Sedento, ávido de água. 2. Seco em extremo, falto de água. 3. Fig. Sedento; ávido; muito desejoso. Como se depreende, o elemento chave é a falta de água. A qual, no limite, também pode ser a metáfora para outros apetites. Que inclui, ora aí está, o apetite de comer, perdoem-me o recurso estilístico. Portanto, não é de descartar a possibilidade de o jornalista, alucinado com os aromas de uma sopa de beldroegas, ter efectuado um trajecto linguístico singular, bizarro mesmo. Ou seja, o percurso que vai de um oxímoro a um simples pleonasmo.
Mais à frente, o jornalista entrevista alguns transeuntes. A páginas tantas, questiona um jovem sobre "o que é que andava ali a fazer"!!! Isto na suposição, presume-se, de que o jovem pudesse ser um ET, um adepto de uma claque de futebol em vilegiatura serrana, ou um pré-delinquente a quem foi dado o devido "correctivo das sopinhas". O mencionado jovem respondeu, sensatamente, que vinha "experimentar umas sopas". "Sopas?!", zuniu o jornalista. "Então vocês não gostam mais de bifes e assim?", acrescentou. Claro que a luminária queria dizer hambúrgueres. Claro que o perguntante estava surpreendido por causa de o jovem estar ali, "normalmente", e não num estabelecimento de fast food a empaturrar-se de toxinas, ou a fumar um charro, ou a insuceder na escola, ou a jogar ao braço de ferro com um professor numa sala de aula, com um telemóvel de permeio. Claro que esses clichés (temos que chamar as coisas pelos nomes), alimentados em grande parte pelos media, são de tal forma irresistíveis que o nosso jornalista não evitou sucumbir diante deles. Imaginemos que diante da sopa. Precisamente.

sábado, 14 de novembro de 2009

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Ainda Borges

Un hombre que cultiva un jardín, como quería Voltaire.
El que agradece que en la tierra haya música.
El que descubre con placer una etimología.
Dos empleados que en un café del Sur juegan un silencioso ajedrez.
El ceramista que premedita un color y una forma.
Un tipógrafo que compone bien esta página, que tal vez no le agrada
Una mujer y un hombre que leen los tercetos finales de cierto canto.
El que acaricia a un animal dormido.
El que justifica o quiere justificar un mal que le han hecho.
El que agradece que en la tierra haya Stevenson.
El que prefiere que los otros tengan razón.
Esas personas, que se ignoran, están salvando el mundo.

Los Justos (Jorge Luis Borges, Obras Completas, III, 356)

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

The kick


Até dói, só de ver. Reparem que o jogador que pontapeou também ficou aleijado. Notáveis, mas irritantes, os risinhos dos comentadores...

Campanha "o último a sair apaga a luz"

Por via do "Água Lisa", chegou-me um artigo de opinião do "Avante", que assim reza:
"A campanha política, ideológica, institucional e mediática em torno dos 20 anos da chamada «queda do muro de Berlim» foi massivamente difundida pelos media e conduzida por uma assinalável «santa aliança» anticomunista entre extrema-direita, direita, social-democracia, ex-comunistas e a chamada «nova esquerda».As classes dominantes recorrem, mais uma vez, à revisão da história para erigir com estas «comemorações» uma gigantesca farsa que tenta apresentar o acontecimento como uma «revolução», uma vitória do «bem» sobre o «mal», um acto de «libertação», ocultando simultaneamente a História e as reais razões da construção do Muro como as provocações e as acções militares e de espionagem hostis dos EUA, Grã-Bretanha e França contra a RDA e o campo socialista, sinalizadas logo no início do pós-guerra."
Nem sei o que dizer. A não ser que a arteriosclerose avançada produz efeitos como estes. Mesmo assim, para quem gostar de literatura fantástica, vale a pena a leitura integral do artigo. Fica o registo, para memória futura.

A irmandade da sucata


O Supremo Tribunal de Justiça acaba de declarar nula a transcrição de uma conversa telefónica entre Armando Vara, arguido do processo Face Oculta, e o primeiro-ministro, José Sócrates, por considerar que a gravação da mesma necessitava de autorização deste tribunal superior. A decisão baseia-se numa disposição da lei processual penal, segundo a qual o PM, à semelhança do PR e do Presid. da A.R., responde perante o Supremo. Neste caso, o STJ considerou que a recolha de meios de prova está incluída nessa prerrogativa. A lei é estúpida? É! Cria um obstáculo à celeridade de uma investigação desta envergadura? Sim! A mais elementar prudência não aconselharia, ao invés, que Noronha do Nascimento ratificasse a transcrição? Claro! Tanto mais que se está em pleno período eleitoral naquele órgão e as suas recentes declarações sobre investigação criminal só nesse âmbito podem ser entendidas...
Ora, as notícias dão conta de que Sócrates, nessa conversa com Armando Vara, averiguou soluções para o "amigo Joaquim". E quem é o "amigo Joaquim"? Pois bem, o proprietário de um conhecido grupo de comunicação social muito "amigo" do PS e do Governo. Não se sabe em que ponto entraria o sucateiro Godinho nessas soluções. O mesmo que parece pairar por cima de todos os negócios que envolvem certas empresas públicas, qual Quasimodo incinerador, o factotum do trabalho sujo, o canalizador avençado sempre à disposição no quintal das traseiras do regime.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Stalker

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

A queda do Murro

Marx disse que o capitalista não trabalha para aquecer, nem por caridade, e que o Capitalismo não recua perante nenhum crime. Mas foi Max Weber que encontrou, no espírito protestante, as raízes desta ganância. Com Marx e com Max, o Mundo ficou Maxi, escuro, frio e ardente. Depois, veio o Comunismo e, porque alguns estavam perdidos ou agarrados a ilusões antigas, tiveram de morrer para escolher o seu campo. Milhões de Homens e Mulheres foram desafiados por um anjo de fogo a escolherem metade de uma coisa que não podia ficar por dividir. E comportaram-se como náufragos no Mar, como se o chão se tivesse liquefeito sob os pés e como se perdessem de repente a memória. O mundo a que chegámos, na Europa e outras zonas onde chegou a civilização moderna, da fornicação e da invenção, foi, portanto, produzido pela violência, pelo massacre, pela fossa comum e pela câmara de gás. Não me considerem pessimista. O mundo de Marx, que era, como todos os mundos antes dele, também negro, foi iluminado como uma noite incendiária, de Nero. Por trás dos amanhãs que cantam, os hoje foram insuportáveis. Todos os sacrifícios e todas as infâmias foram exigidas. Restou alguma coisa? Até os índios do Brasil, Lévy-Strauss descreveu como vivendo numa imensa ternura e liberdade, mas exprimindo uma «alegria animal». Penso que Lévy-Strauss se calou, porque percebeu que tudo o que dissesse, só faria pior. Quem dá o nome a uma nuvem, obriga a que ela se desfaça em chuva, ou então a nuvem obscurecerá o resto do dia. E caiu o Muro de Berlim. Durante algum tempo, os obcecados da luta ardente notaram os outros muros que se levantavam, como o da Cisjordânia, o recuo do muro para Leste, a fronteira sul dos Estados Unidos, a muralha do Mediterrâneo. Mas nem isso rendeu. De repente a Europa passou a ser toda festiva, a comemorar em cada esquina com efemérides como o calendário da Revolução Francesa. Liberdade…e a liberdade fez-se obra, nas mesquitas a abarrotar de gente, nos marines americanos violando uma adolescente iraquiana ou matando um irregular que se fazia de morto no chão, perante a Televisão. Igualdade…nas contas, nos cartões de crédito, nos telefones e nas redes todas escutadas, nas ascensões vertiginosas e nas quedas obscuras. Fraternidade…nas famílias desfeitas, nos sexos pulverizados, nos irmãos mordendo-se como lobos, nas solidões provisórias sustentadas a cirurgia estética e terminadas em morte assistida. Alguém desfez o mito de que a muralha da China, a qual não excede cinco metros de espessura, se via do Espaço. Mas descobriu-se, depois, que era um terço mais comprida do que se julgava. Como uma serpente, a História infame foi rodeada pela cobra, sábia, sobrevivente, venenosa, de olhos de diamante. O Muro de Berlim caiu, deixando entrar os bárbaros meio ébrios, já sem a força de a arrebentar e deram-se todos no pátio de um campo de prisioneiros a que chamaram Liberdade. Como o comunismo, que era apenas um véu sobre a mesma sociedade industrial. De repente, acordámos todos numa fábrica durante uma festa de Natal da empresa. Tínhamos todos sido gaseados devagarinho, durante uma época inteira. E ficámos todos a mais, todos precários e a prazo, presos no recinto da Europa. Como é falsa a ilusão da liberdade em que um dos maiores sábios do Ocidente diz que os índios, civilização perdida dos grandes massacres e fossas comuns, têm uma «satisfação animal». Felizmente que se calou, com as suas euforias de animal. Percebeu que o último Direito Humano é um Dever: o enorme silêncio.

André

Sarebbe bello vivere una favola - 14

Lido

«Sócrates transformou a política numa comédia de enganos, que já não engana ninguém; e que as circunstâncias não encorajam a credulidade do cidadão comum. Ainda por cima, não existe maneira de atribuir a longa estagnação da economia portuguesa, o défice do Estado, a dívida externa e o afastamento da "Europa" ao carácter depressivo e malévolo de uns tantos "descontentes". No Restelo, estão agora economistas com números e bastam esses números para justificar as profecias mais lúgubres. Parece que, afinal, os pessimistas tinham razão. Numa semana (e falta ouvir Medina Carreira), Silva Lopes, Ernâni Lopes, Campos e Cunha e Bagão Félix mostraram bem como o desânimo se tornou irreversível. Ernâni Lopes resumiu o sentimento geral. "Esta década", disse ele, "é uma década sem garra, sem ideias, sem verdade, sem força, sem lucidez, sem substância... (É) uma década de incapacidade na visão estratégica e de fantasia na leitura da realidade económico-financeira... (É uma década de um) permanente esforço exibicionista sem conteúdo e uma expressão sem nobreza... Nunca vi nada assim." Convém lembrar que, nesta década (de facto, quase década e meia), governaram Portugal Guterres, Barroso, Santana e Sócrates. No total, 11 anos de PS, três de PSD. E Sócrates continua.»

Vasco Pulido Valente, no "Público" de 6/11

sábado, 7 de novembro de 2009

O Trabant do gajo

Lido

"(...) também sou tremedista, irreparavelmente lúcido; logo, incurável pessimista. Vi de tudo ao longo da vida, engoli seco os maiores insultos, assisti às mais reles manifestações de que a mediocridade despeitada se serve, tive de obedecer aos mais refinados poltrões e fingir que me enganava ao tomar essas árvores pela floresta. Essa foi a sina da minha geração, apanhada entre uma geração que tudo quis destruir para enriquecer e outra que, privada de todas as referências, pratica inocentemente crimes e se vangloria por coisas que não merecem um palito. Lembro-me do tempo em havia futuro e se pensava que à noite se seguia o dia, que uma inteligência oculta e justiceira se encarregaria de dar sentido ao tempo, premiar o valor e condenar e maldade. Tudo isso desapareceu. Ficámos, eu e a minha geração, agarrados a teorias sem ponto de aplicação, à ideia de um Portugal com glória e luz de que todos, afinal, se riem, a um comedimento inibidor - chamar-lhe-ia uma discreta elegância - que a geração que nos precedeu tomou por cobardia e que a geração que nos sucedeu interpreta como quixotismo."

"A minha geração, que não deu em nada", no "Combustões"

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Os intocáveis

O processo Face Oculta deu-me, finalmente, resposta à pergunta que fiz ao ministro da Presidência Pedro Silva Pereira - se no sector do Estado que lhe estava confiado havia ambiente para trocas de favores por dinheiro. Pedro Silva Pereira respondeu-me na altura que a minha pergunta era insultuosa.
Agora, o despacho judicial que descreve a rede de corrupção que abrange o mundo da sucata, executivos da alta finança e agentes do Estado, responde-me ao que Silva Pereira fugiu: Que sim. Havia esse ambiente. E diz mais. Diz que continua a haver. A brilhante investigação do Ministério Público e da Polícia Judiciária de Aveiro revela um universo de roubalheira demasiado gritante para ser encoberto por segredos de justiça.
O país tem de saber de tudo porque por cada sucateiro que dá um Mercedes topo de gama a um agente do Estado há 50 famílias desempregadas. É dinheiro público que paga concursos viciados, subornos e sinecuras. Com a lentidão da Justiça e a panóplia de artifícios dilatórios à disposição dos advogados, os silêncios dão aos criminosos tempo. Tempo para que os delitos caiam no esquecimento e a prática de crimes na habituação. Foi para isso que o primeiro-ministro contribuiu quando, questionado sobre a Face Oculta, respondeu: "O Senhor jornalista devia saber que eu não comento processos judiciais em curso (...)". O "Senhor jornalista" provavelmente já sabia, mas se calhar julgava que Sócrates tinha mudado neste mandato. Armando Vara é seu camarada de partido, seu amigo, foi seu colega de governo e seu companheiro de carteira nessa escola de saber que era a Universidade Independente. Licenciaram-se os dois nas ciências lá disponíveis quase na mesma altura. Mas sobretudo, Vara geria (de facto ainda gere) milhões em dinheiros públicos. Por esses, Sócrates tem de responder. Tal como tem de responder pelos valores do património nacional que lhe foram e ainda estão confiados e que à força de milhões de libras esterlinas podem ter sido lesados no Freeport.
Face ao que (felizmente) já se sabe sobre as redes de corrupção em Portugal, um chefe de Governo não se pode refugiar no "no comment" a que a Justiça supostamente o obriga, porque a Justiça não o obriga a nada disso. Pelo contrário. Exige-lhe que fale. Que diga que estas práticas não podem ser toleradas e que dê conta do que está a fazer para lhes pôr um fim. Declarações idênticas de não-comentário têm sido produzidas pelo presidente Cavaco Silva sobre o Freeport, sobre Lopes da Mota, sobre o BPN, sobre a SLN, sobre Dias Loureiro, sobre Oliveira Costa e tudo o mais que tem lançado dúvidas sobre a lisura da nossa vida pública. Estes silêncios que variam entre o ameaçador, o irónico e o cínico, estão a dar ao país uma mensagem clara: os agentes do Estado protegem-se uns aos outros com silêncios cúmplices sempre que um deles é apanhado com as calças na mão (ou sem elas) violando crianças da Casa Pia, roubando carris para vender na sucata, viabilizando centros comerciais em cima de reservas naturais, comprando habilitações para preencher os vazios humanísticos que a aculturação deixou em aberto ou aceitando acções não cotadas de uma qualquer obscuridade empresarial que rendem 147,5% ao ano. Lida cá fora a mensagem traduz-se na simplicidade brutal do mais interiorizado conceito em Portugal: nos grandes ninguém toca.

Mário Crespo, no JN de 2.11

Sem espinhas


"... Benfica’s near-total domination of Everton two weeks ago was no fluke. They boast Europe’s most fearsome attack and, even without their creator-in-chief, Pablo Aimar, they have an arsenal that would trouble any team in any competition."
no Daily Telegraph

"Everton 0 Benfica 2: Javier Saviola and Oscar Cardozo silence Goodison Park"
título do Daily Mail

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Foi há 20 anos...

Cartier-Bresson, "O Muro de Berlim", 1963

As efemérides, embora sejam associadas à evocação cerimonial de um acontecimento passado, também designam tábuas astronómicas que indicam, dia a dia, a posição dos planetas no zodíaco. Confuso? Não. Há casos onde aquilo que não se pode mudar co-habita na mesma palavra com o que muda permanentemente. Como aqui. Onde uma palavra raramente tenha um sentido tão abrangente como quando se aplica aos acontecimentos que levaram à queda do Muro de Berlim. Nessa noite de 8 para 9 de Dezembro de 1989, encontrava-me em Estrasburgo. De visita ao Parlamento Europeu, na qualidade de dirigente estudantil. Soube o que se estava a passar através da TV. Percebi imediatamente que o "socialismo real" tinha perdido a guerra e que a Europa voltaria a ser uma unidade política. Acabei agora de assistir a um excelente documentário na RTP 2 sobre a história do Muro. Duas imagens a reter: 1º o efeito em cadeia da visita de Gorbatchev à RDA, convidado de honra do 40º aniversário da fundação do país. Porém, na tribuna era aplaudido por dezenas de milhar de manifestantes, que desfilavam e gritavam por Gorbi, ignorando os dirigentes comunistas alemães. 2º o discurso de Honnecker, nessas cerimónias oficiais, num edifício rodeado por uma maré humana que clamava por liberdade, mas onde aquele afirmava convictamente que "o socialismo na pátria de Marx e Engels estava assente em bases indestrutíveis"... Ocorreu-me também que, daqui a dez anos, o então secretário geral do PCP prestar-se-á de bom grado ao mesmo papel, no seu bunker, rodeado por meia dúzia de indefectíveis...

Publicado no jornal "O Interior"

Nota: Ler aqui outras memórias do Muro, de João Tunes.

A idade dos porquês - 5

Porque é que muitos activistas ambientalistas ainda funcionam numa lógica de amiguismo restrito, a preto e branco, sem nunca lhes passar pela cabeça agradecer a sua existência e relevo mediático precisamente aos agressores do ambiente? Não faz muito mais sentido encarar as duas faces de uma mesma realidade?

Brumário

De 22 de Out a 20 de Nov.

Tem aqui início a edição das doze imagens alusivas ao meses do calendário republicano francês. As quais serão editadas durante os períodos temporais a que dizem respeito. Para mais informações, aceder aqui.

Soltas

1. A GlaxoSmithKline, empresa que forneceu as milhões de vacinas contra a gripe A (H1N1) que o Estado português acaba de adquirir, não dorme em serviço. Cada embalagem contem 10 doses. Logo que aberta, essas unidades têm que ser ministradas na totalidade e num curto espaço de tempo, pois não há forma de serem conservadas. Imagina-se o desperdício que isto não vai causar, Já para não falar nos possíveis efeitos secundários, ainda não desmentidos de forma cabal pela comunidade científica. E sobre os quais aqui me debrucei. Entretanto, a comunicação social lá vai fazendo pela vida, criando um clima pré-apocalíptico na melhor tradição milenarista.
2. Os eleitores do Estado do Maine, nos EUA, acabam de chumbar uma proposta legislativa que permitiria o casamento entre pessoas do mesmo género. Tornando-se assim o 31º onde propostas semelhantes foram rejeitadas por consulta popular. Recorde-se, ainda assim, que este Estado é conhecido pelas suas tradições liberais. E que agora revelou um grande bom senso, apesar de uma forte campanha dos lobbies do "sim". Eis uma demonstração simples e clara de soberania popular. Que os nossos esquerdistas iluminados têm enorme dificuldade em aceitar. No entanto, sabe-se que o casamento homossexual está entre as prioridades deste Governo. Apesar de termos sido ultrapassados pela Eslováquia no ranking da UE, da corrupção galopante e de o desemprego aumentar assustadoramente. Portanto, adivinha-se uma votação à socapa na AR, com os deputados da esquerda de polegar para cima e muitos comunistas, ao arrepio da viril tradição estalinista, sentindo que estão a engolir um sapo vivo. Para satisfação da restauração dedicada ao segmento "festas, casamentos e baptizados". Mesmo assim, para mim o assunto tem um interesse limitado. Seria muito mais interessante discutir o casamento poligâmico (o que faz todo o sentido num país com um território em grande parte islamizado durante 400 anos e que resolveria a célebre equação binária do cantor Marco Paulo), ou a produção, venda e consumo de drogas leves, sem restrições. Neste caso último caso, prometo que estaria na linha da frente.
Publicado no jornal "O Interior"

Playlist da casa (20)


Gravação original: 1964 - Clip no Youtube - Apresentação - Na Amazon


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segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Stalker

O Tambor

O mundo ia ficar perigoso. E ficou. Obrigado Adriano Moreira por teres sobrevivido a Revolução. Guido Westerwelle é homossexual. Não te agradeço por seres Ministro, nem da Alemanha, nem de lado nenhum. O povo irlandês votou não a uma União Europeia assustadora. E depois votou a favor. Já não sou irlandês. A república checa votou uma União Europeia assustadora. Apenas salvaguardando não ter que pagar aos alemães que foram expulsos. Obama conseguiu sobreviver à crise económica mas o Serviço Nacional de Saúde não passa. Vá lá. Conseguimos ter um Presidente negro no país mais poderoso da terra. Só isso. Não chegámos a acordo sobre o Clima, em Copenhaga. Não faz mal, os velhos feiticeiros continuarão a mandar chover e nós teremos que tremer de cada vez que embarcarmos num avião porque teremos que ganhar o pão muito longe. O Saramago chama «filho da p…» a Deus, o Deus que alguns doentes terminais invocam para minorar a dor, o mesmo Deus que outros invocam para sonharem pela quinquagésima vez que poderão ser felizes ou, ao menos, ter alguma paz. E uma sala acolheu-o em pé, sonhando o seu sonho pérfido de que, se ele não pode ser Presidente da República, pode partir o palco antes de sair. A Dra. Laura Santos, ilustre sabichona, diz-nos que a «Vida é biográfica», já não é biológica. Na Suíça, o Governo federal vai parar com o Turismo da Morte assistida que organiza viagens só de ida para 400 indivíduos por ano, ao país. Um pedófilo pede para que lhe removam os testículos num hospital. Sim. A vida nunca foi biológica. Tivemos que a defender de armas na mão. Tivemos que ser estudantes de teologia nas montanhas, arrancar balas a frio, ser psiquiatras de nós próprios porque, como diz um ditado do deserto: «os loucos viram o dedo de Deus».
Que restará deste mundo organizado em que as pessoas inventam a lenda do «Big Brother» e a executam como as crianças seguindo a flauta de Hamelin? Que restará deste Mundo, onde o Apocalipse dizia que «ninguém poderá vender nem comprar sem ter o número da besta inscrito na testa» e nós temos números impressos em todas as partes do corpo? A nossa sorte é tão irrisória como os milhões de anos inscritos nos esqueletos dos dinossauros que passearam por oceanos verdeazuis como imperadores sem lei.
Mas sigamos para as colinas. Nem que as colinas sejam os altos e baixos das nossas triplas personalidades, entre os ataques de febre das gripes que crescem nos matadouros, onde os bois gritam de terror, sem testemunhas, de madrugada, onde as porcas mordem a cerca com cio, antes de serem inseminadas artificialmente, sem calor, nem amor. Vamos para as colinas. Como Viriato, o sem-nome, o traído, como os bandidos dos pântanos da China medieval.
Uma Nação não é um Povo, nem um território. Uma Nação não é um Império, nem um Mar. Uma Nação é a floresta obscura do último reduto, onde o meu medo e o teu têm o direito de existir. Quem diria que a Coragem é o nome de baptismo do Medo?!
O Medo é o menino-tambor. Onde há coragem nas fileiras, sem o tambor?

André

Camellia sinensis (4)

Estranha-se, à primeira vista. Todavia, trata-se simplesmente da minha mais recente descoberta no mundo do chá: um vulgar tipo verde compactado, em forma de noz, ornamentado com uma flor de amaranto. Não é o célebre "gunpowder", nem é tão forte, nem tão pequeno, só a densidade é semelhante. Para além de que este é prensado, em vez de enrolado. Pois bem, um minuto após se colocar cada bola em água quente, adquire a configuração da imagem...Neste caso, vale mais pelo efeito do que pelo sabor...

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O "novo" Público

A nova direcção do jornal "Público" entrou recentemente em funções. Trata-se de um título que se tornou, como é sabido, num bastião no jornalismo de referência que escapou à tabloidização. Razões que justificam uma atenção especial sobre essas alterações. Ora, o editorial de apresentação evidencia alguns pontos preocupantes: 1º Sinais inequívocos de uma ostracização do antigo director, José Manuel Fernandes, o que seria perfeitamente evitável; 2º Retorno a uma espécie de idade mítica do jornalismo, sem ideologia oficial, onde imperará, adivinha-se um frentismo politicamente correcto. No entanto, diz-se "Daremos expressão a todos os pontos de vista, mas afirmaremos os nossos"! Afinal, nada que não se tenha visto antes... 3º Embora no capítulo da opinião se tenha assegurado, até ao momento, uma relativa pluralidade de pontos de vista, não é difícil vislumbrar que a redacção venha a assumir a postura de um "colectivo", extensivo à nova directora. O que levará a uma diluição das posições político-ideológicas e à responsabilidade solidária pelas mesmas. 4º Relacionado com o ponto anterior, adivinha-se a tendência para uma predominância de um certo tipo de jornalismo "em directo", ideologicamente motivado. Relembremos as inenarráveis reportagens de Alexandra Lucas Coelho no Médio Oriente. Onde a jornalista se revela como pouco menos do que provedora dos palestinianos radicais, pintando sistematicamente os israelitas como eternos perpetradores do mal.

Resíduos não sólidos

Um pouco de Bíblia, retalhada, cosida e interpretada ao gosto popular, uma pitada de teoria da conspiração, mais a Inquisição, inveja a Roma, anti-papismo primário, insinuações pornográficas, umas manchas de incesto e parricídio, mais histórias de seminário e crimes do Padre Amaro e eis que temos sucesso editorial garantido, de Dan Brown a Saramago. A receita vence desde o século XVIII. As pessoas gostam do sórdido, escaldam de entusiasmo com grandes mentiras, inebriam-se com o apedrejamento de tudo quanto inspire ordem, hierarquia e autoridade.
Tanta indignação contra Saramago e tanta invectiva e desabafo acabam, como pedem as regras do mercado, por atrair clientes. Ora, tenho a certeza absoluta que nove em dez daqueles que compraram o Evangelho segundo Jesus Cristo o não leram e aqueles restantes que o fizeram não compreenderam coisa alguma. A obra é ilegível e deixa de ter piada a partir da segunda página, pois da abolição das regras de pontuação nascem o caos intelectivo, enunciativo e dialógico, que juntos, permitem a fruição de um texto, literário ou não. Mutatis mutandis, escrevam uma receita culinária sem virgulas, pontos finais e parágrafos e provocarão grandes indisposições que terminarão numa consulta de gastroenterologia. Assim é a obra de Saramago, sem tirar. (...) (que) vai voltar a escrever sobre o tema. Está a queimar inutilmente os últimos dias da sua passagem por esta vida escrevendo coisas votadas ao esquecimento. É uma pena, pois se o Memorial tinha o seu quê de curioso e o Levantados do Chão ecoava o que de humano havia no Neorealejo, estas coisas são, como o foram os panfletos de Oitocentos, mero lixo doméstico.

no "Combustões"