quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Protecção essencial

É mesmo verdade. A Microsoft lançou nesta terça-feira a versão oficial de seu antivírus gratuito, o Microsoft Security Essentials, disponível desde Junho na versão de teste. O novo software protege o computador contra vírus e spyware. Muito fácil de usar, o programa é compatível com a plataforma Windows XP e seguintes. Como novidade, o emprego de cores para avisar o utilizador do estado do seu computador. Se está tudo verde, por exemplo, é sinal de que a máquina está livre de ameaças. A Microsoft divulgou que o seu objectivo não é concorrer com empresas como a McAfee e Symantec, que operam no mercado da segurança, mas sim chegar ao público que ainda não usa este tipo de ferramentas. O programa garante protecção em tempo real e está disponível sem qualquer licença. Além disso, é muito intuitivo e a instalação é muito simples. Depois, é executado em segundo plano, libertando assim recursos do sistema e encurtando os tempos de espera.

Requisitos mínimos, incluindo um sistema operativo Windows XP (SP2, SP3), Windows Vista (Gold, SP1, SP2), ou Windows 7* :
  1. Para Windows XP, um PC com CPU de 500 MHz e 1 GB de RAM;
  2. Para Windows Vista e Windows 7, um PC com CPU de 1,0 GHz e 1 GB de RAM;
  3. Vídeo VGA de 800 × 600 ou superior;
  4. 140 MB de espaço em disco disponível;
  5. Conexão com a Internet para instalar e baixar as definições de vírus e spywares;
  6. Navegador IE 6.0 ou mais recente ou Firefox 2.0 ou mais recente.
* A Microsoft já nos habituou a estas golpadas, mas o que é que se há-se fazer?

Leituras

Acabei de ler esta obra monumental. Valeu bem a pena, mais pela vastidão das fontes consultadas pelo autor do que pela análise macro dos factos em presença. Mais pelo tratamento minucioso da informação do que pelas teses apresentadas. Como exemplo, Gilbert procura sempre dar um rosto, um nome, aos factos descritos. Sejam eles um acto de heroísmo, ou de barbárie. Deste modo dificultando a intervenção do esquecimento. Tudo isto na melhor tradição anglo-saxónica. No fundo, trata-se de um excelente artigo jornalístico escrito por um excelente historiador. Deixo-vos com dois episódios que não resisti a transcrever:
1º Na véspera de Natal de 1944, com o III Reich já perto do fim e com a frente ocidental às portas do Reno, "os alemães lançaram um ataque final de bombas voadoras V2 contra a Inglaterra. As bombas, além da carga explosiva, continham cartas de prisioneiros de guerra britânicos, que se espalhavam no ar como confetti, na altura em que as bombas rebentavam. 'Querida', dizia numa delas, 'Aqui vai uma carta extra que inesperadamente fomos autorizados a escrever, mandando os nossos votos de Natal." (pág. 806);
2º No início de 1945, desenhava-se o assalto final à Alemanha, estando para breve o encontro das frentes leste e oeste. "Na noite de 15 de Janeiro, Hitler regressou de comboio do seu quartel-general do Ocidente para a Chancelaria do Reich, em Berlim. Enquanto o comboio avançava na direcção da Alemanha, um coronel SS do seu Estado-Maior observou, de maneira a ser ouvido por Hitler: 'Berlim será para nós o quartel-general mais prático; em breve, bastará apanharmos o autocarro para chegarmos da frente Ocidental à Frente Oriental!' Hitler começou a rir" (pág. 815). Após este fugaz momento de humor, desconhece-se o destino do coronel...

Stalker

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Notícia de última hora

O eterno Valentim Loureiro, na sua campanha em Gondomar, está a oferecer bilhetes para um concerto do Toni Carreira.

Com um Guronsan passa...


É com a mais profunda e sincera satisfação que tenho descoberto torrentes de suco gástrico desproporcionado em alguns ilustres blogonautas, ainda não conformados com a vitória de Pirro do berloque de esquerda. Mesmo assim, não desistem de caluniar, chantagear, antecipar o perfil do futuro Governo. Esquecendo-se que foram os eleitores, no exercício do seu poder soberano, quem retirou o Bloco da mesa das futuras negociações. Isto apesar do cenário apocalíptico apresentado pelo profeta Louçã. Ou seja, a "culpada" foi a enorme sabedoria do povo português. Portanto, os da esquerda caviar ainda vão ter muito que pedalar até atingirem a credibilidade e a consistência ideológica e programática dos Verdes na Alemanha. Olha só do que nos livrámos!!!...

domingo, 27 de setembro de 2009

No phone? Oh, my God!

Fogos circunscritos

As boas notícias deste domingo eleitoral (em Portugal e na Alemanha):

1. O PS perdeu a maioria absoluta
2. O PSD entrou provavelmente em processo de desagregação, caso se reduza a uma simples congregação de interesses e caciques autárquicos. Para quando a criação de um Partido Liberal?
3. Haverá uma maioria de esquerda nas bancadas parlamentares, mas será puramente nominal.
4. O CDS é a 3º força política, afirmando-se como representante da direita não envergonhada e combativa.
5. O PCP continua a transformar as derrotas em vitórias, fazendo lembrar cada vez mais o célebre ministro da informação iraquiano, clamando que os americanos estavam a perder em todo a linha, enquanto os tanques aliados percorriam já as ruas de Bagdad. Seja como fôr, a descida dos comunistas jurássicos para último dos grandes é uma evidência de modernidade.
6. O BE cresceu, mas não o suficiente para conseguir ser um parceiro para uma possível coligação, pois ficou a dois deputados de poder oferecer uma maioria a Sócrates. Passou para 4º lugar, sendo-lhe negado o bronze precisamente pelo CDS/PP, o representante da direita que os bloquistas tanto zurziram. Espera-se também que a sua influência na governação seja pouco mais do que nula. Atendendo também ao ressentimento que a sua campanha agressiva anti-Sócrates gerou no PS.
7. O especial prazer ao ver este BE-travesti-do-PSR a morrer na praia. Imaginando o Dr. Louçã - que ao espelho não parava de perguntar se haveria líder melhor para a esquerda do que ele - aos saltinhos em cima do chapéu, como um personagem do "Amarcord" de Fellini, ou auto-fustigando-se com um chicote oferecido pela Opus Gay.
8. Houve cerca de 100 000 votos em branco, representando 1.75% dos sufrágios, constituindo o sexto "partido" mais votado.
9. Angela Merkel, embora o seu partido tenha baixado a votação, irá governar em coligação com o Partido Liberal.

Stalker

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

O voto útil

Adeus a uma frente de batalha. Bom-dia a outra.

Se houver um terramoto, em Bruxelas, se caírem as Instituições Comunitárias, com os seus eurocratas lúbricos e os seus carros potentes, quem se quiser salvar que vá para a Praça do Vieux Marché. Lá ainda se sente que os chefes belgas, de Ambiorix, que resistem aos Romanos, esperam nas florestas sombrias que já não existem senão nos seus olhos mergulhados na cerveja soturna. São tudo gente em fuga da Ásia, gente irmanada no pavor, loira e morena, que foge ao asteróide, despenhando-se do firmamento, para sempre imortalizado na cruz celta. Disse isto um dia a uma mulher grega de rara beleza. E ela, nos seus olhos azuis, como a mármore descendo degrau a degrau à beira-mar, percebeu perfeitamente que somos gente que foge, desesperada, com os filhos nos braços, a um mal inexplicável. Só querem um lugar para se abrigarem, inclusive os loiros resplandecentes, que foram uma vez albinos e que saltam dos Drakkars como cães loucos, porque não podem viver sempre à luz do sol. São os sentimentais, os ingénuos apavorados. Os que atacavam nus as legiões romanas, pintados de azul, como a noite em que se refugiavam, e que venciam ou morriam no primeiro ataque. Os que se entornavam como vinho novo sem taça. Se fores ao Vieux Marché, hás-de lá ver aquela velha vendedora ruiva que fala compassadamente, depois de atravessar a orla da morte, numa trombose. Cada vez que a ouvia, percebia que Bruxelas tem uma força inesgotável. E aquela mulher magrinha de extraordinária beleza e o corpo esquálido de muitas lutas contra a droga, que vai lendo os livros que vende e não vende um livro que esteja a ler. E os comerciantes árabes, gratos a Alá por poderem ter ali um porto do Mediterrâneo onde toda a gente, aos berros e aos corações, se vai entendendo, os laicos que buscam compreensão, os devotos que encontraram na sua fé uma forma de não serem robots, nem dentro, nem fora da mesquita, porque Alá não nos criou máquinas, criou-nos à Sua imagem. Para quem vir o Vieux Marché, perceberá um dia que o mercado nunca foi uma mão invisível amputada, que não nascemos ensinados e que sofremos todos de amnésias passageiras e temos que bater à porta uns dos outros para que nos lembremos de coisas essenciais. Posso entrar? Esqueci-me do meu nome. Podes-me ajudar? Só nas paredes do Vieux Marché vi um cartaz, não assinado, que me respondeu assim: «terroristas são os que criam guerras, para invadirem terras distantes. Terroristas são os que nos obrigam a viver sempre em medo, medo de que o dinheiro não chegue ao fim do mês, medo de não ter os papeis em dia, medo da polícia, medo do trânsito, medo das doenças girando nos canos. Ai dos que julgam que a liberdade é comer um iogurte biológico numa cidade em que os seres humanos são as pedras de um muro!». E, na bruma do Vieux Marché, onde deixei o coração, vejo a sombra fantasmagórica do bom Rei Balduíno, que viveu e reinou estreito no seu povo, deixado preso, por um fio, pelos políticos oportunistas. Vejo-o montar um cavalo velho e o povo que se junta a ele unido como um uivo rouco, na bruma, rondando com ele, em silêncio, pelo Vieux Marché, pelo direito a ter uma alma que custou tanto a preservar. Pelos que caíram, contra os invasores, com nomes flamengos e valões, uns sobre os outros, bendita sejas, Bruxelas, campo de batalha, entre outros, rumor de Ambiorix na floresta, grito ensandecido de Robin Hood voando das árvores, olho do furacão.

André

Um lugar de nascimento

Recanto à entrada do Parque de Egmont. Um dos grandes momentos deste Verão.

atrás dos dias...

atrás dos dias há outros dias
os que nunca chegaram
os que julgamos perdidos
os que rasgam a memória
e destroem o presente
como sismos
os que pousam na vida
sem se ver
partículas de nada
os que vivemos por dentro
actores mudos
desajeitados
do que nunca é

A.M. in "A Imitação dos Dias"

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Acabem com o programa já!


"Lei? Mas qual Lei? Agora o futebol tem Leis?"

palavras de Guilherme Aguiar, ex Presidente da Liga de Futebol e adepto do FCP, durante a última emissão do programa "desportivo" "O Dia Seguinte", na SIC, não disfarçando a proverbial azia por o Benfica ter quatro vitórias consecutivas, enquanto Dias Ferreira, do Zbórdem, palitava os dentes
a preceito e ia contando os piolhos da barba.

O capuchinho vermelho

No "Portugal Profundo", António Balbino Caldeira elenca a sucessão de "enérgicos" desmentidos de Sócrates e Louça, após o PSD ter denunciado a preparação de uma coligação pós eleitoral entre o PS e o BE. Vale a pena dar uma vista de olhos. Deliciosa é a citação final, que não resisto a transcrever, já traduzida:

"A primeira regra da política: nunca acreditar em coisa alguma, até ser oficialmente desmentida."

Francis Claud Cockburn, citado em «Yes, Minister» ( BBC, 1984):

terça-feira, 22 de setembro de 2009

O noivado do sepulcro

Compreende-se o aparecimento de Alegre e Soares na campanha do PS. Garantir as franjas eleitorais da esquerda socialista é uma questão de vida ou de morte. No entanto, parece-me que o circo só ainda agora começou. As hordas milenaristas de Louçã não abrandam o ritmo. A pressão é enorme e Sócrates tem muitas razões para estar preocupado. Há então que fazer uso da prata da casa, reunir à volta da fogueira, pois a Pátria socialista poderá perder o controlo do Estado. O pior pesadelo para os boys e girls, que enxameiam a administração, e para os spin doctors, que determinam a agenda informativa. Noutras palavras, daqui até ao fim da campanha, vamos assistir a uma série de apostasias, seguidas de conversões à esquerda, como há muito não se via. Uma espécie de meio termo entre as operações militares "Rufam os Tambores" e "Barbarossa". E é bom não esquecer que foi na última que Hitler invadiu a Rússia e aí precipitou o seu fim. Ou seja, na feliz conclusão de Pacheco Pereira, "votar Sócrates hoje significa dar meio voto ao PS e meio voto ao BE."

Nota: enquanto escrevia este texto, ouvi lá fora a fanfarra, os megafones e alguma agitação. Soube então que era Sócrates y sus muchachos em campanha, no seu périplo pelo "interior esquecido". Ele há coisas!

O gajo noutro planeta

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Tábua de marés (43)


Não há que abusar dos adjectivos, bem o sei, da mesma forma que não se deveria abusar da comida ou do álcool. Todavia, o mundo está cheio de obesos e dipsómanos. Verdad? Ora, não é exactamente a esta adição gramatical que me refreia. Quando os adjectivos me dominarem, farei uma cura de desintoxicação e poderei esquecer-me para sempre deles. Entretanto, vou flutuando sem esforço de maior, rodeado de uma campina aprazível, que faz lembrar a Toscânia no seu melhor. Entre um mergulho e outro, comento mentalmente a sessão cinematográfica da noite anterior. Depois de um opíparo jantar nas cercanias. Trata-de de Slumdog Millionaire (Quem quer ser Milionário?), a oscarizada película inglesa passada na Índia. Paul Eluard, o poeta francês amante da simplicidade, o mesmo que soube descrever numa única estrofe toda a ambiguidade do mau estudante, esse que "diz não com a cabeça, mas sim com o coração" (ou era ao contrário?), escreveu também algures que "há decerto outros mundos, mas estão neste". É uma frase tão concisa e clara que, há alguns anos, foi utilizada na publicidade televisiva, onde aparecia uma piscina privada ainda mais convidativa do que aquela em que me encontrava. É que a câmara lenta tem um poder subjugador, hipnótico: embeleza até os tarantinianos tiros na cabeça com abundantes salpicos de sangue e miolos. É claro que tinha ficado bastante impressionado com o filme do concursante hindu; talvez porque conhecia muito bem dois dos mais recorrentes métodos de tortura argentinos: a imersão sem escafandro e os choques eléctricos. Neste caso, além da cegueira com uma colher de pau, novo para mim, e o mergulho na merda humana, toda uma metáfora, a película de Danny Boyle ensina-nos como se pode sair de toda essa desgraça. Precisamente com a ajuda de um golpe de sorte que nos faça milionários e a companhia de um amor "que te cuide, que te cuide". Love is a magnificent thing, já se sabe, sabêmo-lo todos, e graças a ele, ao maravilhoso, angélico amor, um documental de ritmo acelerado sobre a miséria actual nas grandes urbes pode converter-se num conto de fadas com Happy End, ao estilo Bollywood. Suponho que para pagar de alguma forma tanto aprazível, apiscinado prazer burguês, decidi ver no dia seguinte outro blockbuster de forte conteúdo social: Gomorra. Não vou por-me a criticar agora a redundância de certas cenas, nem a confusão que produz um casting de actores secundários, supostamente não profissionais com rostos familiares, nem sempre diferenciáveis. O filme é certamente digno e não oferece possíveis finais felizes: os corruptos sê-lo-ão ainda mais, os que pretendam um percurso autónomo despertarão convertidos em cadáveres crivados de balas. Os resíduos tóxicos cobrirão o mundo, temperando com cianeto os nossos melões, e uma Grande Camorra Globalizada acabará por dirigir cada segundo das nossas vidas, através da ambição, da necessidade, da ignorância e, sobretudo, do medo. Ainda que a minha já manifesta adição aos adjectivos possa levar a mais equívocos, queria ainda referir outro filme maior, The Cooler (Má sorte, 2003), com Maria Bello, Alec Baldwin y William H. Macy como cabeças de cartaz. Azar, dinheiro, máfias e finalmente amor; novamente um grande amor que tudo vai mudar. Las Vegas é um lugar iluminado em excesso, onde se passeiam um punhado de pessoas com demasiada ambição e pouco discernimento. À margem, tentando não cair ruidosamente do tapete, encontram-se os perdedores de sempre. Interpretados com algum brilhantismo por Macy e Bello, estas duas personagens quase normais merecem melhor sorte. De tal forma que o guionista e realizador, Wayne Kramer, um bom tipo, criativo, audaz e inteligente, decide então presenteá-las, permitindo-lhes escapar do círculo infernal onde se haviam encontrado. Pela minha parte, depois de farejar, graças ao cinema, estes outros mundos não tão distantes, decidi que o lugar onde estou, o meu pequeno universo quotidiano, não se parece demasiado com esses infernos. De sorte que ainda não me atrevo ainda a chamá-lo de paraíso. Mesmo não tendo, para já, relação alguma com o conhecido tecno-purgatório de Huxley.

Tábua de marés (42)


Sonho que vou morrer. É quase uma fatalidade, depois de tanta necrologia ambiente. Como se trata de um sonho, não faço o trajecto descansado. Para mim, para "nós", esse longo túnel de que muitos falam acabava em algum lugar da História - assim, com maiúsculas - algo que não me interessou demasiado. Se não houvesse em mim uma pretensão de distanciada elegância cortesã, poderia no entanto ser mais importante dizer que esse particular momento histórico "não me interessou um c......". Não perguntem sequer de que lugar ou de que século estou a falar. Não tenho a mais pequena ideia. Pelo contrário, sei muito bem que nada faria para além de assomar o nariz, pois o que cheirei não me agradou particularmente. Uma paisagem vazia e desolada, desprovida de encanto; sem árvores, animais, gente.
"É isto a morte?", perguntei a mim próprio no sonho. Helas! Prefiro esquecê-la como possibilidade de transcendência, continuar a acreditar na minha versão particular, definitivamente mais simples: fechas os olhos, deixas-te ir com suavidade e já não te inteiras de nada. Posso sentir como a minha alma se estende e relaxa da mesma maneira que o faz o meu corpo no final de uma sessão de yoga. Se o paraíso não é um lugar ilimitado, com todas as infinitas possibilidades da nossa fantasia, prefiro ficar como estou agora. Ao menos aqui posso estender-me num sofá qualquer para ver um filme de 1943, Criss Cross, onde Burt Lancaster mostra todos as suas qualidades, muitas das quais continuaram quase intactas até ao fim dos seus dias. Na obra aparece também o sempre ambíguo Tony Curtis, com os seus momentos de anjo perverso. E fá-lo como extra absoluto, sem sequer um crédito, dançando mambo latino com Ivonne de Carlo num suposto bar de Los Angeles. Se por essas coisas da canícula quero algo mais à la page, posso devorar essa iguaria feita com estranhos ingredientes que se chama Breaksfast on Pluto. Onde aparece Brian Ferry como sedutor sádico -bigode tipo "anchova" de vilão antiquado e com um imprevisível fio assassino entre as mãos - sabendo-se então a dimensão da "merda" por que passa um travestido irlandês algo boémio e que, logo ao nascer, foi logo rejeitado pelo pai, um charmoso pároco, e pela mãe, uma ruiva a que muitos acham parecida com Mitzi Gaynor, actriz deliciosa dos anos cinquenta e que agora quase ninguém recorda. Com menos tremendismo que em Jogo de lágrimas e um fundo quase constante de pegajosas canções da época, dirigiu-a o sempre resvaladiço Neil Jordan. Para terminar este post algo ecléctico, uma breve citação. Não está assinada por uma figura ilustre como Goethe, Duras, Deleuze ou Nietzche, mas por um médico italiano de cinquenta anos, Mario Melazzini, arquejado de uma enfermidade degenerativa irreversível. Li-a hoje enquanto tomava o pequeno-almoço e deixo-a para vós agora, como uma pequena e refrescante oferenda, neste último dia de verão:
"SER AUTÊNTICO SIMPLIFICA ENORMEMENTE A VIDA"

domingo, 20 de setembro de 2009

Tábua de marés (41)


O que posso dizer da película "argentina" de Coppola, apresentada no último Festival de Cannes? Que é praticamente horrível? Que desde há muito não via algo tão mau num écran de cinema? Ambas seriam apreciações demasiado superficiais, sínteses algo simplificadoras das desagradáveis sensações que deixaram no meu corpo, no meu cérebro, na minha sensibilidade e - mesmo desejando que não houvesse chegado até aí, posso receá-lo - no meu já suficientemente açoitado inconsciente, as duas horas de sacrificada ingestão deste pudim indigesto chamado Tetro. Estava ansioso por ver o filme, reconheço. Tanto mais que criado por um realizador que admiro desde há muito e que agora decide ter como cenário um país tão estonteante e complexo. Mas vamos já já ao que interessa. Para que não pensem que sou assim tão negativo, tentarei salvar alguma coisa deste titânico naufrágio. Aqui vai pois uma pequena lista de salvados:
1) O jovem actor de nome impronunciável: Alden Ehrenreich. Quase um clone de Leonardo DiCaprio, conserva uma ambígua e terna ingenuidade infantil, actua com elegante naturalidade, apesar do estranho enxame de desengonçados que o rodeiam durante todo a longa, inacabável, metragem do filme.
2) A fotografia a preto e branco: clássica nos seus claros/escuros, sempre expressiva, por momentos magnífica.
3) A música, tão bela como redundante, misturando sons reconhecíveis do tango e o folclore argentino. Em muitos momentos é utilizada para destacar situações supérfluas que, supostamente, deveriam dotar o filme desse carácter porteño que Coppola encontra na rádio Colifata - é-lhe dedicada uma longa sequência quase documental dentro do filme- ou no mate amargo que a fotogénica e sempre algo distante Maribel Verdú oferece ao seu jovem cunhado.
Haveria que resgatar algo mais? Talvez o rostro impenetrável, cinematograficamente imprescindível, de Vincent Gallo. É melhor esquecer a patética aparição de Carmen Maura, num arremedo exasperante, óculos com armação de massa branca pelo meio, da escritora Victoria Ocampo. Como teria sido este personagem interpretado por Javier Bardem? Cego, talvez?
Mais perguntas: o que pretendeu Coppola com este, segundo ele, seu filme mais pessoal? Fartar-se para sempre? Visitar essa Argentina decadente, acelerada, superficial, orgiástica, soberbamente felliniana? Tudo faz crer que nunca recuperou o guião que lhe furtaram da sua casa do bairro de Palermo. E, com a produção já em marcha, teve que inventar este montão de absurdos enredos familiares no mais puro estilo Soap, à medida que ia filmando. É triste observar como o criador de O padrinho e One from the heart, o homem bigger than life, que arriscou várias vezes a sua fortuna pessoal para fazer o cinema que desejava fazer, se vende agora por um simples prato de lentilhas ao falso luxo de Swarovski, rapina nos coutos privados de outros realizadores - o último Leonardo Favio, Wong Kar Wai e Almodóvar entre os mais notáveis - e passeia-se com um olhar irónico e superficial pelas vastas pampas argentinas. Pouco mais que um cenário onde ele e a sua filha se fazem retratar para poderem vender-nos, também, as icónicas maletas de monsieur Louis Vuitton.

Ver anterior

sábado, 19 de setembro de 2009

Eles vivem!


Hoje de manhã, na marginal, deparei com mais um outdoor do berloque de esquerda. A mensagem é clara: "Estamos prontos!". Vendo-se, por trás, imparáveis, os rostos mais conhecidos daquela força política. Ou seja, como os votos ganhos com as causas fracturantes já atingiram o seu limite natural, mesmo que empolado pelas sondagens, toca de se apresentarem como alternativa "séria", "credível". Ficámos a saber que os trotsquistas estão prontinhos para tomar de assalto a democracia "burguesa", desmantelar a economia "capitalista", transformar Portugal num acampamento permanente de assistencializados, desprivatizar, desprivatizar, aumentar a carga fiscal para níveis incomportáveis, criar uma comissão de zeladores do politicamente correcto, com o Torquemada Oliveira a superintender, tornar enfim esta parcela atlântica (ainda mais) ingovernável!... "Eles vivem", portanto. Tal como as figuras (na imagem) do filme de Carpenter, com o mesmo nome.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Smart car

Lembram-se das fichas utilizadas nos carrinhos de choque? Bastava introduzir uma na ranhura respectiva e o "bólide" começava logo a funcionar. Pois bem, a ideia foi, pelos vistos, aproveitada para fins comerciais. A ilustrá-lo, apresento-vos o Streetcar. O sistema só opera, tanto quanto sei, em Londres. Trata-se de uma modalidade de aluguer de viaturas tipo plug and play. Ou seja, o processo é de uma facilidade arrazadora. Primeiro reserva-se uma viatura pelo telefone ou online, sendo fornecido ao cliente um smart card. Basta então dirigir-se à viatura, passar o cartão pelo sensor e introduzir o pin respectivo. E pronto, já está! By the way, não se esqueçam de circular pela esquerda!

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

sábado, 12 de setembro de 2009

A tenda dos milagres

Ontem pude assistir durante algum tempo à emissão do canal BENFICA TV. Esperava uma programação dinâmica, plural, entusiástica, com alguma imparcialidade na defesa e promoção da instituição, pois só assim a imagem que passa terá alguma credibilidade. O que vi desmentiu completamente essa expectativa. Estava a passar uma emissão onde o pivot era o Ricardo não sei quantos, aquele rapaz de barba que já moderou um programa de má língua na SIC, chamado "não sei quê dos infernos". Desculpem-me estas brancas. O facto é que praticamente não vejo TV e, quando o faço, opto pelos canais temáticos. Havia então dois convidados. Um deles, mais comedido, lá ia mostrando capas antigas de jornais desportivos e dizendo umas loas. O outro, logo que o vi, percebi logo: "temos aqui case study!" Imaginem um personagem que consegue debitar o catecismo oficial da actual direcção, somando para isso inanidades que nem numa conversa de tasca ficariam bem! O fato à pato bravo, o verbo fácil, o adjectivo luxuriante, a desfaçatez primária, o sectarismo delirante, o riso escarninho, a proverbial barriga de marisco, compoem razoavelmente o personagem. Ou seja, o factotum típico, o homem de mão do intendente Vieira. Que poderia estar ali ou a vender tectos falsos ou carros usados. Em vez disso, tece encómios ao chefe, sem uma réstia de humor e muito menos dignidade. Por fim, há uns telefonemas em directo, de adeptos dos 18 aos 70 anos, de Caminha a New Jersey, de Sagres a Maputo. Pois acreditem que o discurso é afinado pelo mesmo tom: a eterna teoria da conspiração, "agora é que é!", "nada de euforias, pois o sistema já começou a manobrar,, "Jesus é o Salvador!". Desta forma se comprovando o seu benfiquismo em versão vieirista. A lengalenga confessional prossegue, como um ritual acrítico, deprimente, insalubre... Em verdade vos digo, meus amigos; prefiro assistir à TV dos evangélicos, com milagres em directo e promessas em diferido! Haja paciência! Ser benfiquista e manter a lucidez, como tenta fazer o escriba, dá trabalho que se farta!

NOTA (13.09): Hoje fui hoje assistir ao jogo do Restelo. E nada melhor para "normalizar" a minha relação com o clube do que os quatro secos com que os de Belém foram despachados!

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

A Bússola

(clicar para aumentar)

Tem dúvidas acerca do seu posicionamento político? Não tem paciência para assistir aos debates na TV? Quer ser confrontado com o que realmente pensa sobre temas-chave para o futuro do país? Quer saber qual é realmente o seu terreno político, mesmo que só na conjuntura actual? Então vá sem demora à Bussola Eleitoral, no site da SIC online e faça o respectivo teste. As perguntas demoram só alguns minutos a responder e os resultados, que poderá gravar, são imediatos, sob a forma de um diagrama. No meu caso, bateu praticamente certo. Como poderão comprovar na imagem* o circulo determinou uma tendência esmagadora para o vector "Libertário-cosmopolita", sendo aí ligeiramente dominante a área da direita em relação à da esquerda.

* com a preciosa ajuda do Jing, um pequeno mas eficiente programa de captura instantânea de imagens. Recomendado.

Céline (1)



Tinha que ser. Depois do aperitivo e das entradas, o prato principal. A sopa virá no fim. A edição é da Ulisseia (1983) com tradução superlativa de Aníbal Fernandes (a utilização do termo "caracolando" tirou-me do sério). Pelos vistos, Céline não me larga. Os homens realmente livres são o único exemplo que é preciso levar a sério. Ainda recordo como a primeira leitura da "Viagem ao fim da noite" me deixou meio zômbico durante uns tempos. Por acção do petardo corruptor. Ou seja, por obra e graça da missão principal da literatura: corromper. A releitura que agora decorre tem ainda "isso", mas já tem "outra coisa". Recordo o que escrevi há tempos sobre o leitor errante:
"O livro é, não obstante as limitações da memória, como um quadro: no momento em que se acaba a leitura, tem paisagens, vales, dobras sombrias, cor, corografia. Dos seus picos (cobertos com a neve dos sublinhados) os pobres espremem citações, os sábios erigem torres académicas e os vagabundos visionam panoramas de intensidade, medo e fascínio. Há também um ambiente, nos livros. Uma luz do lugar. Um sopro. Às vezes um odor, único, que atravessa o país desvelado pela primeira leitura. No fim do livro é que começo a ler. Na revisita é que apreendo esse espírito que une leitor e escritor na mesma aflição. A aflição que impele à escrita e à leitura, conclui o leitor errante. Num instante está ali tudo. Tudo, mas nada ainda é conhecido. É aqui que se deve começar a ler."
Depois farei aqui as contas finais, é claro.

Céline (2)



Mais duas edições da "Viagem...". Da primeira, cuja data desconheço, só em algum alfarrabista é provável encontrar um exemplar. A segunda, de 2006, é uma reedição da tradução da Anibal Fernandes, da Ulisseia, agora sob a chancela da editorial Verbo.

Céline (3)

Procura-se! Quem souber do paradeiro de algum exemplar deste infame livro de poemas, é favor denunciar o caso. Sem medo. A edição é da "Hiena", com tradução do incontornável Aníbal Fernandes. Vá, fico à espera...

Abracadabra

Reproduzo, com a eliminação do intróito, um comentário que deixei no "Café Mondego", a propósito de um convite aí lançado por Américo Rodrigues aos seus leitores. O tema do desafio é a afirmação e confrontação de diferentes propostas para a Guarda.

Interessa-me sobretudo aquilo que divide, mas que, nem por isso, pode deixar de unir. A Guarda tem sido muito mal servida de governantes. Os custos toda a gente conhece. Menos os que beneficiaram das benesses do poder, como é de calcular. A Guarda precisa de um novo ciclo de vida, como de pão para a boca. Até agora, não vi nenhum candidato habilitado para essa ruptura. Um por falta de coragem, outro por incapacidade, os outros por impossibilidade prática. Claro que o jornalismo predatório praticado na cidade interfere demasiado na agenda política, antes e durante o período negocial, pré contratual, a que se resume a campanha eleitoral. Algo que só aos candidatos e eleitores diz respeito. Mas isso não explica tudo. É por isso que o problema não está nas "ideias" propostas, no seu brilhantismo, no seu perfil mais ou menos programático. O principal está no rigor com que se vai gerir uma estrutura ciclópica como a CMG, em que 2/3 dos recursos são afectados a despesas de funcionamento! O principal está na capacidade de gerar investimento. O principal está na coragem em abolir velhas práticas, desmantelar redes de interesses que paralisam a cidade, mobilizar o mérito e não os cartões partidários. Para atrapalhar, já basta a opacidade, os pequenos feudos, a resistência à mudança, as camarilhas que gerem pequenos interesses, com fundos públicos, sem prestar contas a ninguém, os poderes paralelos ao nível urbanístico, a tenebrosa promiscuidade entre a administração local e as empresas de construção, a ausência de uma cidadania actuante e influente, a proliferação de caciques nalgumas Juntas de Freguesia, a desqualificação de grandes sectores da população. Portanto,não obstante alguns terem feito o obituário à política pura e dura, é dela precisamente que se trata aqui. Só a criação de um novo ciclo político poderá viabilizar a Guarda. Com determinação e autoridade. Muito mais do que com listas de boas intenções.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Sondagem


(...)
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço

Alvaro de Campos, O Que há em Mim É Sobretudo Cansaço

Bruges on my mind (1)





Naquela tarde, ele e ela foram finalmente passear, depois de várias tentativas goradas. Logo que entraram na marginal, apanharam uma bicha gigantesca. Tudo isto graças às obras de última hora do Isaltino, esse grande malandrote, mais conhecido pelo "axediador de secretárias" na câmara de Oeiras.





Por fim, lá chegaram à zona de estacionamento do Guincho. Depois de rememorar o que tinha lido numa revista feminina da especialidade sobre o que "elas" pensam que "eles" pensam que "elas" pensam "deles" quando "eles" pensam "nelas", ele, o próprio, passou à acção. Depois do já esperado olhar manso do "posso ir ao armário das bolachas?", aproximou-se dela e beijou-a, ardentemente, como quem anda à procura do isqueiro...

Bruges on my mind (2)





A reacção dela foi tão enérgica como a de um polícia mexicano em período de sesta. Ou mesmo de um burocrata luso perante um pedido de urgência. Vai daí, os lábios ofegantes procuraram-se e tal. De tal forma que, passados alguns minutos, a moça começou a arfar vigorosamente. "Epá, sou o maior, aposto que nem o merdas do J. lá do bairro punha a gaja assim tão depressa!", pensou ele, inebriado...





"Ventilan! Ventilan! Depressa! Tenho asma!" Gritou ela com ar desesperado. "Está aí na minha carteira!" "Despacha-te"! O pedido inusitado gelou o ambiente. Glaciais é o termo mais apropriado para adjectivar aqueles minutos. "Toma! Que diabo, até me assustaste!", rematou ele, encostado ao banco com ar desolado.

Bruges on my mind (3)





Foi então que, apoderado de uma iluminação súbita, lançou a acendalha: "JÁ FOSTE A BRUGES?" Só isto. Ao mesmo tempo, aproximou-se dela com ar lânguido. "Bruges?, Não é aquela cidade flamenga dos canais?" disse ela, rendida, pronta a reiniciar as primícias. "Sim, uma cidade comercial e um porto hanseático durante a Idade Média. Mas cujo assoreamento dos tais canais (risos) ditou o seu declínio, a partir do sec. XVI." Dizia ele, enquanto lhe abria os botões da blusa"... "Já sei, e que foi capital europeia da cultura em 2002", afirmava ela, acesa para os próximos desenvolvimentos.





"E também foi lá que foi impresso o 1º livro em inglês e se desenvolveu uma bolsa de valores no séc. XIV, para além de um sofisticado sistema financeiro", acrescentou ele, enquanto lhe apalpava os seios, já com uma intumescência a notar-se nas calças. "Estou mesmo a imaginar os antepassados do padre Louçã a irem lá executar os banqueiros, com bestas..." Lá ia dizendo ela, arfando, tomada pelo desejo...

Bruges on my mind (4)





"Não dá mesmo é perder um passeio de barco, pelos canais"!...juntou ele. "Tens preservativo?", perguntou ela. "Acho que sim. Locais a visitar: o Beatério, a praça do Burgo, o museu de arte flamenga, o quarteirão do antigo porto, a nova sala de concertos (Concertgebouw), a Igreja de Nossa Senhora, a Grand Place, a Catedral e fazer um raid fotográfico pelos canais." "Bolas, tens aquilo ou não?", insistia ela, depois de mais uma sessão de linguado.





Por fim, encontrou a embalagem do contraceptivo no porta-luvas, com um ar ligeiramente contrariado. Gesto que encerrou o prelúdio erótico, comme il faut. Mas antes, ainda balbuciou. "Se lá fores, não percas por nada deste mundo umas batatas fritas com molho especial nas barracas da praça principal"...

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

A realidade ignorada pela esquerda caviar

Shirin Ebadi, Prémio Nobel da Paz 2003 e autora do livro A Gaiola de Ouro, vem a Lisboa no dia 11 de Setembro, promover este livro e falar sobre as violações dos direitos humanos que ocorrem na República Islâmica.
Shirin Ebadi nasceu no Irão a 21 de Junho de 1947. Em 2003 foi galardoada com o Prémio Nobel da Paz. Shirin Ebadi é advogada e uma activista dos Direitos Humanos. Na mira do regime de Ahmadinejad, devido às suas batalhas a favor da democracia e dos direitos das mulheres, conduz uma intensíssima actividade de propaganda e uma batalha legal que a leva a percorrer o mundo. Publicou O Meu Irão (Sperling & Kupfer, 2006).

nota de imprensa da Esfera dos Livros

A fronteira

Há duas fases bem distintas na existência do comum dos mortais. Na primeira, crê-se que as regras são constrangimentos que oprimem. Na segunda, sabe-se, de ciência certa, que elas existem para nos libertar. Refiro-me, naturalmente, às regras enquanto padrões culturais, mais do que normas legisladas. Sendo que, aquelas cuja convicção de obrigatoriedade é mais poderosa, resultam de uma sageza e de uma rotina de polimento negociada através dos tempos. De modo a que, na maior parte das vezes, surjam em contextos com funções e sentidos bastante diferenciados. Percebi também que, perante a evidência, só há duas atitudes possíveis:
1. A sua deposição não concertada, num dado momento, a que se segue a correspondente substituição por uma "nova ordem" redentora. Pelo menos, para as vanguardas esclarecidas, é claro. Como se a narrativa da História que sustenta tal praxis se resumisse a uma longa marcha até ao seu fim, ao fim da História.
2. Ou, então, perceber que essas regras tem elas próprias uma marca genética, a que se poderia chamar caducidade latente. Actuar sobre as regras significaria uma de duas coisas: apressar-lhe o prazo de validade ou, sendo possível, validá-las enquanto forma para uma situação política e social distinta. Mudança que, sendo impossível sem a subsistência da muitas dessas regras, nunca aconteceria a partir delas.
Escusado será dizer que, no primeiro estádio referido, encontramos o marxismo, o fascismo e seus derivados e subprodutos. Trata-se de uma fase embrionária da acção política. Na segunda fase estão os que, como eu, não ignoram que a liberdade é uma filigrana que requer o cuidado de muitas gerações. Precisamente porque esse trabalho, humilde e verdadeiramente audacioso, poderá nunca ficar concluído.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Stalker

Zapping

A questão da suspensão do jornal de sexta, na TVI, tem contornos mais complexos do que à primeira vista possa parecer. Todavia, ao mesmo tempo, tornou tudo mais claro. Mesmo admitindo que tenha havido anteriormente pressões do gabinete do 1º ministro para que o programa acabasse, custa a crer que, num período eleitoral, tenham sido mais intensas. A ordem de suspensão, sabe-se agora, partiu do próprio Cébrian, patrão da Prisa. Só um ingénuo pensaria que foram imperativos de qualidade que determinaram a decisão. Numa perspectiva empresarial, no universo autofágico da comunicação social, o programa seria de manter, em princípio, pois tinha um share consolidado. Apesar de a emissão dever servir como case study sobre o que não deve fazer-se no jornalismo. Então, se assim é, porquê acabar com ele? Simplesmente porque outra lógica se sobrepôs à das audiências. Num país onde o peso do Estado se faz sentir em todos os sectores de actividade, não seria desejável que a TVI ficasse para trás numa possível reestruturação do sector, ou que tivesse tratamento de 2ª na disponibilização da informação oficial, ou nas habituais prebendas. O grupo detentor da estação assustou-se perante a perspectiva de promover um programa estigmatizado, num país pequeno, movido pela inveja, sem um espaço público plural e transparente e com um Estado imenso. Tudo o resto são suposições. Por outro lado, a reacção de Sócrates é miserável. Afirmando, com um cinismo insuportável, que até gostaria que o programa continuasse, mesmo tendo sido "vítima" no passado da "terrível" Moura Guedes. Mesmo tendo já dito o pior possível da emissão e dos seus responsáveis. Sócrates perdeu aqui toda e qualquer credibilidade política para quem gosta de manter um mínimo de exigência em relação a quem nos governa. E o caso Freeport está longe de ter terminado...

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Mais um tasco* onde o gajo papou em Agosto

*Forêt de Soignes, entre Bruxelas e Waterloo, para onde, conta-se, Carlos V ia caçar

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

O Estado da Nação

"O País está a afundar-se com muita rapidez e os maiores responsáveis são o PS e, nos últimos anos, José Sócrates. Muita gente que beneficia do poder socialista faz tudo para ocultar esta realidade, mas, desde 1995, que Portugal é governado pelo PS com excepção de pouco mais de dois anos. Ou seja, o PS moldou as políticas governativas em 12 dos últimos 14 anos. Não há nada que possa iludir esta realidade. Por muito que o PSD também tenha responsabilidades na situação actual de Portugal, e algumas terá, ninguém as pode comparar às do PS. Se o País empobreceu, se o País está cada vez mais longe da Europa, se o País não cresce, se a agricultura, a indústria, as empresas, as escolas, as universidades, a justiça, a segurança social, a economia e a sociedade, a cultura e o bem estar conhecem uma crise, a responsabilidade primeira é do PS, com uma responsabilidade acrescida por ter governado em dois momentos excepcionais, no governo Guterres com uma das conjunturas internacionais mais favoráveis, e no governo Sócrates, com uma maioria absoluta, um Presidente responsável e uma oposição enfraquecida (...) Quer num quer noutro caso, as oportunidades foram perdidas. Eu não gosto da expressão, mas, do governo Guterres, após milhões e milhões de contos (contos não euros) recebidos e que se esfumaram sem se saber como, saiu-se de “tanga”, e do governo Sócrates, pior porque a nossa dívida ultrapassa todos os limites aceitáveis. Pior ainda, com Sócrates saímos zangados uns com os outros, cansados da política, descontentes com a democracia, sem esperança, com enormes custos sociais, sem destino, confusos. O PS desbaratou todas as oportunidades, porque as suas opções governativas, a incompetência dos seus governantes, as suas concepções do Estado e do exercício do poder eram erradas e são erradas. Nas eleições que agora se vão realizar, o PS vai de novo propor as mesmas políticas e naturalmente, se ganhasse, continuaria o declínio de Portugal na mediocridade e na pobreza (...). Na verdade, os nossos socialistas são mais jacobinos do que socialistas. Os socialistas hoje são jacobinos modernos, convencidos que são donos do Estado e do País, e que são melhores, mais racionais, mais progressistas do que todos os outros. (...) Não queremos a patetice das “causas fracturantes”, uma cópia deslavada da agenda do Bloco de Esquerda, cujo único objectivo é tornar igual o que é diferente, obrigar pela lei a que a sociedade seja menos plural, e que responda a diferentes valores e a diferentes opções de vida. Por detrás de um aparente progressismo, o que há é a obsessão de por o estado a mandar em tudo com pretexto na criação de uma sociedade falsamente laica imposta aos cidadãos, onde, em nome da igualdade, se destrói a liberdade individual e a diferença."

Pacheco Pereira, na evocação de Alexandre Herculano, em Vale de Lobos

Basta!

Para que conste, estou-me literalmente nas tintas para a Selecção Nacional de Futebol. A que melhor seria apelidar de Selecrete (ou a Escreção), dada a abundância de jogadores brasileiros "nacionalizados" à pressão. Ou seja, um grupo com o "disciplinador" C7 como capitão, uma equipa que se limita a rodar jogadores do FCP para aguçar o mercado, sem um único titular do Benfica e sob a batuta do clarividente Queirósz, não augura nada, mas nada de bom. Espero que a derrota na Dinamarca seja estrondosa.

Momentos Zen - 57

Quando a árvore cai, os macacos dispersam-se


Ver anterior

O achado


Descobri este raríssimo exemplar do número da revista dedicado ao autor da "Viagem ao fim da noite", num simpático alfarrabista da baixa de Bruxelas. A edição é de Outubro de 1991. Nem queria acreditar no que estava a ver! A vida e a obra do genial escritor são aqui analisados à lupa. Desde a reedição dos panfletos ao seu estilo único, passando por uma entrevista praticamente inédita, de 1958.

Pela Serra d' Arga (1)

Trilho da Chã da Franqueira
Local: Arga de Baixo, Serra de Arga, Caminha
Distância: 6 Km
Trata-se de um percurso bastante fácil, circular, com início na aldeia e passagem pelas antigas minas, alguns núcleos rurais característicos do Alto Minho e pela bacia da Ribeira de Arga, onde pontuam as magníficas quedas de água das Penas. A penosidade aumenta se na noite anterior se folgou no arraial de S. João de Arga, no mosteiro com o mesmo nome, ali ao lado. Nota negativa para a sinalização deficiente e errática. As entidades promotoras esquecem-se que não basta marcar oe percursos e está o trabalho feito. A manutenção é fundamental. Eis o registo fotográfico:






Pela Serra d' Arga (2)



A brisa em volta

Poucos momentos se conhecem da vida de Qu Yuán, o primeiro poeta chinês. Terá nascido no seio de uma família aristocrata, cerca do ano 340 a. C. Ocupado alto cargo como oficial no Reino de Chu. Sido expulso devido a calúnia. Escrito o Li Sao (Elegia da Separação). Escrito o Jiu Ge (Nove canções). Escrito uma parte da colecção de textos do Reino de Chu que dá pelo nome de Chu Ci (Versos de Chu). Aquando da notícia da queda do Reino de Chu às mãos do Reino de Qín, ter-se-á lançado ao rio Mì Luó, suicidando-se, de desgosto. Contava 63 anos e corria o ano de uma era anterior à de Cristo em 277 anos. Em resumo: nasceu, conheceu a glória, a desgraça, a escrita e a morte por asfixia. Ao todo, conto sete dias assinaláveis. Os dois dos extremos biológicos do mortal, os dois dos limites da sua vida pública, os três em que a sua mão se curvou para dar a ver através de tinta.
Desconhecemos por completo que tempo fez durante estes dias que se destacaram das seis dezenas de anos (mais mil dias) que durou a sua vida. (Choveu? Fez sol? Nevou? As nuvens iam altas?) E como seria diferente a sua biografia aos nossos olhos se nos tivesse chegado a singela frase: Quando Qu Yuán iniciava a redacção de Jiu Ge, um pouco acima, a brisa contornava as laranjas que ainda se conservavam suspensas no azul.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

As novas botas de caminhada do gajo

O nó

Aplaudo sem restrições o veto presidencial ao projecto-lei de regulamentação das uniões de facto, aprovada recentemente pela maioria parlamentar. Se há matéria sobre a qual sou sensível é a da invasão da esfera das liberdades pessoais por uma esquerda festiva e que utiliza a sua ideia de igualdade como um rolo compressor. Neste caso, um PS em fim de mandato, acolitado pelos comunistas e pelas hordas fracturantes bloquistas, não hesitou em tentar fazer passar pela porta do cavalo algo que a sociedade nunca reclamou, nem o seu programa eleitoral mencionou. Esta medida tem duas leituras óbvias. A imediata, diz-nos que o timing para uma eventual reaprovação parlamentar da lei irá recair na próxima sessão legislativa. Com a decorrente incerteza da próxima composição parlamentar. O PS quer assim demonstrar trabalho perante a esquerda "histórica" e marcar pontos nas eleições que se avizinham. Por sua vez, uma leitura não imediata revela-nos a profunda insensatez deste tipo de medidas. Repare-se no seguinte: a recente lei do divórcio veio instituir, na prática, uma espécie de permissão para o "divórcio na hora", desprotegendo, nos seus efeitos, a parte tendencialmente mais fraca. Isto é, conseguiu relativizar os deveres e exponenciar ficticiamente os direitos. Com a recente proposta, vem-se atribuir efeitos jurídicos a uma situação de comunhão de vida, onde as partes não quiseram precisamente que eles existissem! Porque se realmente os quisessem tinham optado pelo casamento! Ou seja, o Estado, munido do característico jus imperii, vem meter no mesmo saco situações inconfundíveis, determinadas exclusivamente pela esfera de liberdade pessoal dos envolvidos. Criando assim uma espécie de casamento atípico, onde são atribuídos direitos a quem nunca os pediu e negados os deveres que os justificam. A esquerda jacobina deve estar orgulhosa desta "obra" proselitista! De uma estupidez inaudita. Até porque as situações injustas criadas por via das uniões de facto, do ponto de vista securitário, da transmissão do arrendamento e sucessório, já estavam devidamente salvaguardadas no ordenamento jurídico em vigor. É quanto basta. Tudo o mais é uma intromissão intolerável na privacidade dos cidadãos. Por outro lado, há quem defenda que o projecto agora vetado vem trazer alguma protecção aos casais homossexuais. Mas se assim é, então mais valia que a maioria parlamentar assumisse, corajosa e frontalmente, o casamento entre nubentes do mesmo sexo! Porém, essa medida é pouco "aconselhável", em termos de contabilidade eleitoral. Ora bem... Mais interessante foi ver a reacção de alguns parlamentares ao veto presidencial: "arcaico", "ultra-conservador", "reaccionário", que "quer manter a injustiça", etc. Sem um único argumento razoável em defesa do projecto. Só faltou o providencial grito de guerra da "esquerda unida, sa": "seu façista!". Em resumo, didáctico, mas de uma tristeza aterradora.

Bailarico e carne assada

É de realçar a utilização intensiva das redes sociais pela candidatura de Joaquim Valente à Câmara da Guarda. Esta desmultiplicação por ferramentas de agregação como o Twitter ou o Facebook, entre outras, evidencia uma estratégia consentânea com o marketing político do momento. No entanto, não basta marcar presença nas redes, durante o período eleitoral, só porque é "moderno". Basta ir ao site oficial da campanha e perceber como, neste propósito, a informação se pode resumir a propaganda. Nem sequer o programa eleitoral, um manifesto, ou a composição das listas lá estão para consulta! Sim, porque ainda há algumas abencerragens, como é o caso do escriba, que gostam de ver esses "pormenores", antes de decidirem o sentido do seu voto.