segunda-feira, 31 de julho de 2006
sexta-feira, 28 de julho de 2006
A selva
Crimes exemplares - 6
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quarta-feira, 26 de julho de 2006
A Pimba do Pimba
Da linguagem - 2
Até aqui há uns anos, os homens eram educados para não mostrar emoções, serem frios e distantes. A minha geração foi a primeira que já não foi educada assim. Demonstrar emoções é coisa que não perturba. Se não as demonstramos, uma de três coisas pode acontecer: a) não estamos interessados; b) estamos interessados noutra pessoa; c) não estamos para nos dar ao trabalho, que mulheres há muitas, por isso esperamos até vir uma menos exigente. And that's all folks! Se um homem se esgueira a falar muito sobre emoções é porque ou não quer entrar ou quer muito sair da relação e não sabe bem como. Não nos incomoda a nega propriamente. Mas como elas pensam que ainda nos vemos como heróis de capa e espada prontos a servir a sua donzela, ou uns Steven Seagals prontos a andar à porrada por elas - o que no fundo até desejam, mas não admitem - detestamos ser desmancha-prazeres e dar más notícias directamente. E por isso adoramos tanto E-mails e SMS, formas ideais para acabar relações. As mulheres escreveriam cartas, debateriam semanas se era a atitude certa. Nós não, simplificamos ao telemóvel ou no MSN, evitando uma cena emocional. Nenhum homem que eu conheço sente uma necessidade inadiável de ir ter com os amigos e desabafar sobre a última discussão (será que ela ainda me ama ou a nossa relação está num marasmo?) ou dissecar aquilo que ela disse/fez/terá pensado/queria dizer (quando ela disse és um querido estava a ser simpática ou a dizer que gosta de mim de uma forma indirecta?). Estas coisas são puramente femininas. Até ver.
terça-feira, 25 de julho de 2006
Da linguagem
segunda-feira, 24 de julho de 2006
Os Idiotas
Desde os anos oitenta que já nos tinhamos habituado a isto: manifestações dos
logo-se-vê-os-maus-estão-sempre-de-um-lado-desta-vez-os-bons-são-aqueles-
rapazes-adoráveis-do-hezbollah-que-tanto-gostam-de-fazer-campanhas-de-
desinfestação-em-bairros-chiques-uns-amores-os-maus-são-os-israelitas-e-
seus-aliados-oh-pá-foi-tão-gira-a-manif-amanhã-saímos-no-jornal...
Haja paciência para esta tropa. Ainda não se deram conta do mundo em que vivem. Não obstante, o delírio seria somente divertido, se a condescendência com o terrorismo associada não fosse imensamente perigosa, quase suicidária.
Pensar não é ter causas fáceis. A minha solidariadade está com quem defende a liberdade e o indivíduo, contra o fanatismo e a barbárie. Israel defende a sua sobrevivência como Estado soberano. É tudo. Como já diziam os romanos, às vezes é necessária a guerra para ter a paz. É o que afirma, por outras palavras, Amos Oz, o grande escritor israelita. Ver aqui.
Em relação ao abaixo-assinado que anda aí a circular, promovido pelo Movimento pelos Direito do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente, onde pontificam nomes de proa da intelectualidade nacional, nada melhor do que as pertinentes questões lançadas por Eduardo Pitta, em "Da Literatura".
Para acabar de vez com as dúvidas acerca do que é e do que pretende o Hezbollah, obrigatório ir a este post, referente a um documentário exibido na Sic-Notícias sobre esta sinistra organização.
sexta-feira, 21 de julho de 2006
Diga 333
Fragmento Dois
o sol da terra destila
a respiração das pedras
a inquieta passagem
do vento
por entre as áleas:
aparição fugaz
a da hera
quando abraça a árvore
quinta-feira, 20 de julho de 2006
domingo, 16 de julho de 2006
Diário de um tolo - 4
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sábado, 15 de julho de 2006
Ganda Fezada!
Esta introdução serve para um apontamento acerca do Congresso da JS, que decorre este fim de semana aqui na Guarda. Terra tradicionalmente pêésseira, onde pontificam os boys mansos, devidamente pastoreados por uma nomenclatura de patuscos "sempre em pé". Ora, segundo informações que me chegaram através do "Corta fitas", os meninos portaram-se à altura. De registar algumas pérolas do pensamento político contemporâneo, encontradas numa das moções votadas. Espero que o Gato Fedorento dê conta deste filão. Estão preparados? Ora aqui está:
"Dificilmente um grupo de 25 jovens brancos, todos homens, produzirá ideias realmente inovadoras."
"Vamos abandonar as frases feitas e os jargões (a começar pela palavra jargão!).
"Vamos juntar JS e uau na mesma frase!"
"Pensamos que já ninguém questiona que o mundo está a mudar e depressa. E já há algum tempo, perguntem ao Camões!"
"Podemos falar de cegonhas ou do lince ibérico, ainda é assim é política!"
"Aos jovens cabe escolher entre a JS e o ginásio. JS ou Morangos com Açúcar?"
"A Europa é um conteúdo, não um continente."
"Precisamos de aumentar a natalidade."
"Temos que nos livrar da dependência do petróleo."
"Devemos racionalizar, diversificar. A aposta num só cavalo não parece uma estratégia acertada."
"A opção pelo nuclear não deve ser negligenciada."
"O potencial da energia solar é igualmente imenso."
"Ninguém é dono das nuvens."
"Cérebros tristes não produzem."
"Acabou o sexobofismo e o secretismo. Tabus já eram."
"Todos somos sexuais."
Baril, não é? Mas por favor deixem o Camões fora disto, está bem? E já agora, quando for para natalizar, não usem a camisinha, vale?
A comédia dos enganos
sexta-feira, 14 de julho de 2006
O Riso de Céline
Louis-Ferdinand Céline, Ele, Rabelais, Falhou o Golpe
O particularismo da voz megalómana, voz delirante, de Céline, está em mostrar o absurdo que há em não termos fé nos sentidos, fé nas emoções. A grande idolatria que é o termos medo das sensações... medo de sentir. Com o seu delírio megalómano, procurava Céline esmagar o medo no próprio lugar em que ele mais facilmente se insinua, medo que se apodera das sensações, medo que erradamente tomamos por a verdade das sensações, medo da voz que nelas julgamos pressentir. Precisamente a tirânica voz do Verbo, essa voz que era já o demónio de Sócrates e aquela que foi depois o instrumento do poder sacerdotal dos evangelistas, esses homens capazes de mudar a «direcção do ressentimento». Mas também a voz dos gramáticos encartados e a voz presente nas boas orações literárias de todos os dias santos.
Lírico como jamais houve, homem-pássaro sem igual, Céline recusava a idolatria, e a do Verbo mais do que qualquer outra. Se escrevia era para se poder vingar da falsa «eloquência natural», para se desforrar do palavreado insidioso com que o Diabo se disfarça de bom Deus. «Temo que não nos libertemos de Deus enquanto continuarmos a acreditar na gramática», escreveu um dia Friedrich Nietzsche. Céline, esse, poderia ter dito: «Temo que não nos libertemos da gramática enquanto continuarmos a acreditar no Verbo». Eis uma equação que o sr. doutor Destouches não enjeitaria.
Escrevendo para «ganhar a vida», Céline cantava. Céline assobiava. Para isso dispunha ele de uma técnica incomum, técnica forjada numa gaguez incomparável com a qual torcia as boas maneiras da língua. Rabelaisiano, desconfiado que era das “boas sensações”, das sensações conformes ao Verbo, ninguém como ele, larápio e fugitivo, atacou tanto os poderes instalados no edifício central da sua língua materna. Ninguém como ele desarmou todas as manhas e perfídias que denunciam o outro lado do seu bom-tom: «Um tom igual ao dos liceus, um tom igual ao do jornal de todos os dias, um tom igual ao das discursatas, um tom igual ao das declarações do Parlamento, ou seja, um estilo verbal, talvez eloquente, mas em todo o caso nada emotivo». «Words, words and words»... «tics, tics et tics»...
Foi sobretudo pelo modo como empregava o argot, pelo modo como passava o «falado» a «escrito», pelo modo, enfim, como nessa transposição encontrou a única forma possível de exprimir a emoção (para ele a fonte de onde brotam os actos essenciais da vida), que Céline se tornou conhecido. Conhecido, sim, mas jamais amado: «La gloire ne va qu’aux morts, n’est-ce pas. Les vivants n’arrivent qu’à l’Académie». Sob este aspecto, Céline era profundamente mal-educado, obsceno até, ele que, exigente, cruel, vigilante, submetia as palavras a uma intensa tortura de parto. Mas Céline nunca quis contar, ele quis apenas fazer SENTIR... Eis a fórmula para o seu generoso conceito de estilo. Com ele, é a própria emoção que se transforma imediatamente em carácter. Não se pode pedir muito mais...
Se, por acaso, Céline leu Beckett deve ter rido e sofrido com a imaginação do irlandês. E se a grande crença de Kafka – e o que, por meio dela, permite ligar o judeu de Praga ao jesuíta de Dublin – é a consciência de que há uma «culpa» que nos é exigida em troco do saber que «há qualquer coisa em nós que é indestrutível», ou, dito à maneira do irlandês, que subsiste, apesar de tudo, «um continuar quando não se pode continuar», para Céline a paciência é uma virtude de beatos. De beatos cansados das emoções que apenas a vida – e não o Verbo – pode justificar. Precisamente a Santa Paciência do Verbo que ensina às ovelhas a boa maneira de balir... «“No princípio era o Verbo.” Não! No princípio era a emoção. O Verbo veio depois, para substituir a emoção, tal como o trote substitui o galope, mas o galope é que é a lei natural do cavalo; ao trote obrigamo-lo nós».
São conhecidas as birras de Céline contra a dialéctica. Contra o arrazoado. Contra as ideias. Contra a propaganda. Neste aspecto, o seu lirismo é o avesso aristocrático do sermonismo democrático e universal de Saúl de Tarso. Também por isso é Céline contra tudo aquilo que não incarna. Contra si-próprio, contra Céline, o histrião preciso. Clínico, conhecedor, quente, eis Céline, o construtor de emoções. Nada, em suma, que nas profundezas da língua se agitasse, lhe escapava: nenhuma maleita, nenhum pus, nenhum micróbio, nenhum tumor, nenhum cancro. Prosa natural e impressiva, prosa também homeopática, a do doutor Louis-Ferdinand Destouches, prosa contra o Verbo de um médico obcecado com a saúde das emoções, pluma lírica emotiva de um naturalista empenhado em curar aquelas infecções da língua que tornam doente a sensação da palavra.
Puritano como era, quando Céline ria, ria para aliviar a garganta, para desgaguejar a emoção, para lhe apagar, por instantes, as reticências. Para evitar o bem e o mal. Para recusar o bem e o mal do Verbo, para recusar, no fundo, o Pecado Original, «não é verdade?», diria ele. Emoção Plena. Inteira. Capaz. Viva.
quinta-feira, 13 de julho de 2006
A crescente instabilidade de Barrett, exacerbada pelo consumo de LSD, levou-o a abandonar o grupo em 1968, sendo substituído como guitarrista por David Gilmour.
Posteriormente, lançou ainda dois albuns a solo — "The Madcap Laughs" e "Barrett".
Nos anos 80 retirou-se para a sua cidade natal - Cambridge - dedicando-se à pintura e abdicando de qualquer aparição pública.
Apesar da brevidade da sua carreira, as frágeis e delirantes composições de Barrett influenciaram vários músicos, de David Bowie — que produziu um cover de "See Emily Play" — à formação posterior dos Pink Floyd, que dedicaram o album "Wish You Were Here" ao seu antigo colega.
Sobre Barrett, veja-se este artigo da BBC News e sobretudo este post, ou este, que vale pelos 2 vídeos incluídos: Syd Barrett sob LSD + «Interstellar Overdrive»
Único - 2
Único - 1
Em 1841, Stirner havia aderido ao Die Freien (os livres) um grupo de jovens hegelianos de esquerda, que tinha como figuras de proa Ludwig Feuerbach e Bruno Bauer A ideia base que os unia era a crença de que a dialéctica implicava que a História percorreu duas épocas absolutamente distintas: o materialismo intuitivo dos antigos (o mundo das coisas) e o mundo do espírito, próprio do cristianismo, cabendo encontrar uma nova síntese.
A Coisa
Já agora, digam lá se a antiga bandeira, anterior à República, não era bem mais interessante. Esqueçam, como eu, as afinidades políticas. O que aqui importa é a estética e a fidelidade à história. Agora comparem-na com a actual... Quid juris?
quarta-feira, 12 de julho de 2006
Para acabar de vez com a vergonha
Todavia, há uma questão por resolver no nosso país, a despenalização do aborto. Como muito bem diz Rui Tavares no seu blogue, o referendo que tarda em aparecer é uma causa paradigmática, onde toda a esquerda pode convergir no mesmo sentido. Com efeito, seguindo o articulista, é necessário confrontar os lideres da direita e os movimentos "Pró-vida" com factos e não com projecções: as inúmeras mulheres que efectivamente já foram humilhadas e condenadas por alegadamente terem praticado aborto. A lei existe, é bom não esquecer, sendo que a pena prevista pode ir de 2 a oito anos. E a triste realidade do aborto clandestino - desde as clínicas de luxo da fronteira espanhola até aos vãos de escada - também! Não metam a cabeça na areia! Não venham com subtilezas jurídicas, distinguindo descriminalização e despenalização! Alterar a legislação vigente - artigos 140º e seguintes do Código Penal - é uma condição para colocar este País no séc. XXI. Aliás, a Igreja, se tivesse uma réstea de pudor, deveria permanecer em silêncio, neste caso. E rezar pela memória das centenas de milhar de almas que condenou na Santa Inquisição.
É pois tempo de acabar com discussões bizantinas na AR e recolocar o referendo no centro da agenda política. O que irá requerer toda a mobilização possível, uma efectiva coordenação funcional e programática, como é referido no artigo. Vamos a isso!...
Leia-se também este texto, que assinala a alteração da posição do autor desde o referendo de 1998.
terça-feira, 11 de julho de 2006
Bolas, isto é cultura...
Depois, a locução do mítico Coelho resulta num meio termo entre a célebre caricatura do Herman do repórter da rádio e um apresentador de uma casa de fados para turistas. O homem só não declama um poema logo ali, em louvor do Penedo da Saudade ou do Choupal, porque o tempo é escasso. O fraseado rebuscado, tipicamente coimbrão, não engana ninguém.
Mas o que é pior, ao ouvir este programa, fica-se com a sensação de que a cultura serve exclusivamente para passar os "tempos livres". Que a cultura do evento é rainha, revelando-se como uma melíflua e prosélita epifania, na voz anasalada de Sansão pós-desbaste capilar. Como uma conveniência apaziaguadora das fundamentais diferenças, das tensões éticas. Como o carrocel da indiferenciação acrítica. Tudo o resto, a cultura como fermento de novos modelos de vida, de diferentes percepções do mundo, fica de fora da canónica agenda. Em nome, claro está, das louvaveis iniciativas para matar os "tempos livres". Não vá o diabo tecê-las.
segunda-feira, 10 de julho de 2006
Fragmento Um
como era difícil chamar os mistérios,
os inumeráveis obscuros lugares
sair dos campos gelados e
tocar de perto a palpitação
dos lábios demorando-se no fogo:
era o uivo dos cães
confundindo-nos com a própria noite
eram nomes puros
nomes duros
nomes cúmplices
revelando transparente refúgios abertos.
vieram então as primeiras chuvas,
longínquas as notícias da neve
- esse imenso cortejo das aves
buscando o chão da terra.
erguido como um arco de fogo
num canto da memória
ficou porém um retrato:
da moldura pendem ainda
os lugares matinais onde
as vozes se procuram,
o aroma das algas,
uns sapatos para os caminhos
que ninguém percorre,
mais além as vestes de um anjo
ardendo na berma do asfalto...
é fácil pois a contagem dos dias,
esse exíguo espaço
entre dois rastos de um sonho
ou duas libélulas sacudindo o orvalho
eis como surge
num relance
a fase das águas:
para o rio continuarei a atirar pedras.
por necessidade.
domingo, 9 de julho de 2006
Perdições
quinta-feira, 6 de julho de 2006
Colosseum
quarta-feira, 5 de julho de 2006
O soccer, o futebol e o clister.
O bom senso dos "founding fathers" da nação americana sempre me fascinou. Um bom senso de pequenos proprietários, num momento histórico em que a tecnologia ainda não tinha separado irremediavelmente o homem da compreensão e do domínio de facto dos objectos com que lida no seu dia a dia. Um bom senso que erigiu um sistema de poderes que se fiscalizam mutuamente e que da política retirou o fundamental: os factos resultam da acção e não de intenções. Sobre eles rege a lei e nada mais. Esse sistema tem impedido que o mundo se tenha tornado um local perigoso e fanatizado. Que esta identificação fique clara.
Mas existe o reverso da medalha. O imperialismo americano não é só retórica. Há uma ignorância irresponsável, uma insuportável arrogância que lhe subjazem. Que alimentam um discurso onde a verdadeira diversidade se reduz ao tipicismo uniformizador e hollywoodesco. Que demoniza quaisquer argumentos que questionem a sua superioridade (veja-se o ostracismo a que Noam Chomsky foi relegado após o 11 de Setembro). E que, finalmente, numa verborreia chauvinista, procura ridicularizar as nações de menor dimensão.
Sobre o assunto, leia-se o apropriado texto de Pedro Martins, em "Sesimbra e Ventos". Aqui
Não te levantarás!
segunda-feira, 3 de julho de 2006
O teste
Note-se a mais que subtil classificação da União Soviética como simples "regime comunista", não como ditadura ou regime autoritário. Por outro lado, se o mapa se refere ao período entre guerras, ignora completamente o regime republicano espanhol, que durou cerca de 8 anos. Ou será que também era autoritário? E os países bálticos não tinham regimes parlamentares? Será que estes senhores nunca ouviram falar da Républica de Weimar na Alemanha, que só colapsou face ao avanço do nacional-socialismo, em 1933? E já agora, será que a I República não existiu neste luso rectângulo?
A Fenprof tem funcionado de modo contínuo como mais uma testa de ferro do Partido Comunista. Facto que ninguém ignora. Agora que a influência ideológica se estenda desta forma ao próprio Ministério da Educação e aos conteúdos dos próprios testes, é assustador.
domingo, 2 de julho de 2006
Crimes exemplares - 5
Ora bem, aqui há uns meses aconteceu aquilo. Ah, não sei se já vos disse, mas detesto duas coisas: qua façam comentários fora de tempo durante as fitas e que me calhe um cabeçudo na fila da frente. Naquela noite ia ver, pela quinta vez, o "Casablanca". Aquilo sim, é que era um filme! Até já sabia algumas cenas de cor e salteado. Só que, na cadeira da frente sentou-se um sujeito que parecia uma torre. Pra chatear ainda mais, era ele sempre a mexer-se no assento, a coçar o cu ou sei lá o quê. E não parava de fazer comentários alarves por dá cá aquela palha. Numa cena em que estava a Ingrid Bergman em grande plano, o tanso gritou: "andas a pôr os palitos ao outro, sua badalhoca!". Não aguentei mais. Saquei da navalha que tinha no bolso e espetei-lha bem na garganta. Na assistência, houve quem se tivesse rido dos soluços dele, até esticar. Se calhar, pensavam que tinha a ver com o filme! Idiotas!
Amanhã vão-me dar as tais injecções. "Vais ficar de vez sem a tosse ", disse-me um guarda durante a revista. Não importa. Espero que haja matiné.
Ver anterior
Fresco
à passagem da luz:
apenas a terra só prometida,
como palavras talvez verdadeiras
como barcos talvez clandestinos.
eis a recordação de outro lugar,
a doçura das romãs,
as cidades adormecidas,
as oferendas de luz
ao recolhimento dos olhos:
apenas movimento sem destino
na intimidade das sombras
apenas uma aldeia. um sinal.
in "Labirintos"