enumero as coisas que me dizem de ti. numa contagem decrescente. hoje é o dia em que todas essas coisas falam. um lírio. um branco de céu onde uma nuvem se desenha em fuga. a luz que se detém numa só gota de orvalho. um pensamento. o melro que lhe debica a polpa. o rumor do mar nas areias da praia. a pele recortada. os arrumos que o tempo encontra em mim. repouso agora num cálice de vinho ao final do dia. olhando as cavernas incandescentes que o lume abre na lareira da sala. palavras e palavras. e tanto silêncio entre elas. há, ainda hoje, um cheiro a pão torrado misturado com o aroma do café com leite e o som de um sino invocando o dever. tudo isso implícito neste sentimento antigo de que o mundo é incapaz de resistir à força do vento que sopra. olho todos os meus livros empilhados por afectos na estante da sala. num calesdoscópio de cores. cheiros. texturas. aí se apertam os pedaços da minha vida. todos eles levam os sublinhados dos meus passos. as personagens do assombro que me habitam. talvez a solidão seja esse vento maior que nós. sabe-se lá porquê acontece-nos. a vida escorre-nos muitas vezes por entre esses momentos de ausência. tanto faz. a eternidade é um só momento. e um nome. um só nome.
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